Se houver uma guerra por parte de Israel, a situação do mundo vai mudar”: um conflito na sombra




INTERNACIONAL
“Se houver uma guerra por parte de Israel, a situação do mundo vai mudar”: um conflito na sombra


10.05.2018 às 21h00






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LIOR MIZRAHI / GETTY
Batalha entre Israel e Irão na Síria prolonga-se há meses, mais ou menos incógnita. Mas intensificou-se: esta quinta-feira, Israel retaliou contra alvos militares iranianos na Síria depois de acusar Teerão de ataques. Decisão de Donald Trump de abandonar acordo nuclear com o Irão terá contribuído para a escalada de tensão. A comunidade internacional agita-se, Israel fala em “tempestade” contra a “chuva” e o Irão garante que uma eventual guerra vai mudar o mundo



HUGO TAVARES DA SILVA


Madrugada de segunda-feira, 9 de abril. Terá sido aqui que o conflito entre Israel e Irão em pleno território sírio começou a ganhar músculo. Um ataque aéreo israelita contra uma base militar que coordenava milícias apoiadas pelo Irão matou quatro conselheiros militares iranianos.

Esta shadow war (guerra na sombra), como lhe chama o “New York Times”, desenrola-se há meses. Os israelitas são aliados dos Estados Unidos, enquanto os iranianos são um garante para os sírios, próximos da Rússia, na luta contra grupos armados e organizações extremistas islâmicas.

Naquela madrugada de abril, a sombra que pairava sobre a guerra viu uma janela abrir-se. A luz começou a revelar o panorama, dissipado no dia 9 de maio, na ressaca de uma decisão: os Estados Unidos abandonaram o acordo nuclear com o Irão, algo que Governo português e Marcelo Rebelo de Sousa condenaram, por representar “um retrocesso para as garantias da paz no mundo”. É um paradoxo: uma assinatura num papel que contribuiu para um Médio Oriente assombrado deixou às claras um conflito armado, com uma semente capaz de colocar gigantes no tabuleiro de xadrez. Poucas horas depois da decisão norte-americana, o verbo entre Israel e Irão começou a ficar ainda mais afiado. No que toca a bombas, idem.

Na noite de quarta-feira, dia 9 de maio, Israel acusou o Irão de disparar 20 morteiros sobre os Montes Golã. “Esta foi a primeira vez que Israel acusou diretamente o Irão de atacar a partir do território sírio desde o início da guerra civil em 2011”, afirmou pouco depois um correspondente da Al Jazeera. Para Harry Fawcett há dois caminhos: “[Essa acusação] ou vai impedir ou vai convidar à escalada [de tensão] do outro lado, agora que essas coisas estão em andamento. A escalada acidental em direção a esses conflitos é sempre uma possibilidade”, explicava.

O ataque, garantiu um porta-voz militar israelita, causou danos “mínimos”, pois terá sido interceptado pela defesa antiaérea israelita. E obteve resposta. Algumas horas depois, Israel levou a cabo uma ofensiva visando, informava o mesmo porta-voz, serviços de informação, logística, armazéns e veículos. Como o sistema antiaéreo sírio foi ativado, Israel informou que alguns alvos militares daquele país acabaram por ser atingidos também. De mão dada com os mísseis, um aviso do ministro da Defesa de Israel: “Eles devem ter presente o ditado que diz que ‘se nos molham com chuva, nós fazemos cair uma tempestade por cima deles’. Espero que este episódio esteja fechado e que eles tenham compreendido”.

LIOR MIZRAHI / GETTY

O presidente da Comissão de Política Externa e Segurança Nacional do parlamento iraniano esteve esta quinta-feira de tarde em Lisboa e condenou os ataques israelitas. "Começou hoje um jogo perigoso", admitiu Alaeddin Boroujerdi, numa conferência de imprensa na embaixada do Irão. Esta ofensiva, diz Boroujerdi, serve para "desviar a opinião pública da atitude do presidente norte-americano por ter saído do acordo nuclear". Ou seja, será uma manobra de diversão. E sentenciou: "Se houver uma guerra por parte de Israel, a situação do mundo vai mudar".

Estas movimentações ergueram um burburinho na comunidade internacional. Emmanuel Macron, presidente francês, pediu esta quinta-feira o fim desta troca de agressões, garantindo que este assunto estaria em cima da mesa na próxima reunião com Angela Merkel, agendada para esta quinta, em Aix-la-Chapelle, na Alemanha.

A Alemanha, outro dos países que assinaram o acordo nuclear agora ameaçado, considerou esta manhã que os ataques iranianos às posições israelitas nos Montes Golã se tratam de uma “grave provocação”. Num comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros, tutelado por Heiko Maas, a Alemanha condena os episódios na Síria e garante que Israel tem o direito de se proteger. “É muito importante que se volte a uma diminuição da escalada da violência na região”, diz a nota. “Isso significa que devemos fazer tudo o que pudermos para finalmente encontrar uma solução política duradoura para o conflito na Síria.”

A Rússia está na mesma página da retórica francesa e alemã. Mikhail Bogdonov, o vice-ministro das Relações Exteriores, mostrou preocupação e pediu “moderação”, anunciando que foram estabelecidos contactos com os dois países. A Rússia anunciou ainda que vai manter a “colaboração estreita” com o Irão relativamente ao acordo nuclear.

Finalmente, através da porta-voz da Casa Branca, os Estados Unidos colocam-se ao lado do aliado. “A ofensiva do regime iraniano na Síria contra Israel é inaceitável e altamente perigosa para todo o Médio Oriente.” Sarah Huckabee Sanders disse também que a “provocação” iraniana legitima atos de autodefesa por parte de Israel. Os EUA convidaram o Irão e os seus aliados, incluindo os libaneses do Hezbollah - que tem combatentes a lutar ao lado de Bashar al-Assad na Síria -, a não darem mais “passos provocadores”.

Segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos, citado pelo Washington Post, morreram 23 pessoas na quinta-feira depois da ofensiva de Israel (cinco soldados sírios e 18 elementos de milícias, cuja nacionalidade é desconhecida). O exército sírio diz que morreram apenas três pessoas nos ataques de quinta-feira e garante que os mísseis israelitas foram interceptados.

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