É preciso saber viver Erasmo supera "anos terríveis" de bebedeira, drogas e perdas com utopia, novo amor e coração biônico






É preciso saber viver
Erasmo supera "anos terríveis" de bebedeira, drogas e perdas com utopia, novo amor e coração biônico
TIAGO DIASDO UOL, NO RIO

Guto Costa/Divulgação
Guto Costa/Divulgação




O que seria do amor romântico sem as músicas de Erasmo Carlos? Não faltam encontros, rompimentos e rompantes apaixonados embalados por 50 anos de canções, muitas em parceria com Roberto Carlos.

O homem que cantou o amor para o Brasil dedica seu 31° disco, “Amor é Isso”, exatamente para o sentimento responsável por ter enterrado os “anos terríveis” de bebedeiras, drogas e perdas.

O momento de descoberta vem logo na primeira canção. “Era um universo puro de uma pessoa / Que me viu um mundo morto portador de vida / Como um beija-flor perdido no próprio jardim”, ele canta em “Convite Para Nascer de Novo”,feita em parceria com Marisa Monte e Dadi.

A redescoberta do amor nessa fase da vida vem pelas mãos da pedagoga Fernanda Passos, sua namorada de 27 anos, mas é algo enraizado no coração, agora “biônico”, do senhor de cabelos grisalhos, mas ainda rebeldes.

Na melhor tradução da filosofia hippie, Erasmo recusa terapia e religiões. “Elas carregam seus dogmas discutíveis, suas coisas incrivelmente terríveis”, observa.

Apesar da fama de mau, esse gigante de 1,89 metros não poderia ser mais diferente do amigo camarada, que, a propósito, ele encontra cada vez menos. “Mas a gente se liga. Se benze, como a gente diz”.

Pragmático, Erasmo segue apenas uma sentença: “O mundo utópico é uma maravilha, é o mundo que eu rezo e que eu sigo”.









O amor sempre tem carga política para quem não ama. Acho que o amor incomoda muitas pessoas. Têm pessoas que não conseguem amar.



Erasmo Carlos

Coração biônico



Em uma tarde de brisa agradável, a dois dias do lançamento do disco, Erasmo desce as escadas até o quintal de sua espaçosa casa, em uma rua sossegada na Barra, zona oeste do Rio, a poucos metros da praia. Entre o verde das paredes da casa e do extenso gramado, o Tremendão aparece de preto.

É uma de suas primeiras entrevistas após um período de recuperação. No processo de finalização do disco, Erasmo teve que parar tudo para um procedimento médico. Justamente quando o coração se enchia de esperança, sentiu um descompasso. Desmaiava com frequência, inclusive durante o sono.

Teoricamente você fica morto e, em alguns segundos, você volta. Mas e se não voltar?

Era uma anomalia na carótida, importante artéria do coração. De um dia para o outro, se viu na maca, com um implante de marca-passo. Horas depois, fez um vídeo no Instagram mostrando o curativo no peito: “Que tiro foi esse?”, brincou.

“Você sabe que pode dar alguma coisa, mas não dá medo. Tem que fazer, faz. Pensa positivo que vai dar certo, como deu”, explica. “Se não desse, não deu. Eu não estaria nem aqui para lamentar”, diz, com riso no canto da boca.

Ele faz questão de mostrar a cicatriz: “Agora eu tô ligado para caramba”

Filosofia do Tremendão





Não busco nada na religião, cara. Busco minha fé e a minha própria religião dentro de mim no que eu sou, no que eu acredito, na boa fé, na bondade, no pensamento positivo e no amor.



sobre religião



Eu tenho um analista maravilhoso. Não me cobra nada e não minto pra ele. É meu travesseiro. Quando eu vou dormir toda noite é foda.



sobre terapia
Arquivo pessoal

Fama de machista



Antes de abraçar a utopia, se tornar um defensor da natureza e um partidário do positivismo, Erasmo andava de cabelo penteado, pose de Marlon Brando e fama de mau.

Um personagem cuidadosamente criado na Jovem Guarda, movimento que invadiu as TVs e os rádios nos anos 1960 e mudou para sempre o comportamento da juventude.

Como um típico garotão dos anos 1960, Erasmo conta que fazia comentários machistas e, sempre que podia, aproveitava os intervalos de shows e programas de TV para espiar cantoras pelo buraquinho da porta.

Daquela fase, Wanderléa se lembra de ser repreendida por usar suas famosas minissaias. “Eles brincavam: ‘Ô Wandeca, menos, menos. Não está curto demais?’. Embora eles possam tudo, não é? Era da mesma forma nas coxias da Jovem Guarda”, revelou a cantora.

Erasmo não esconde: "Ainda tenho raízes, não me libertei de tudo, mas me reformulei bastante. Restou minha altura, a fisionomia, meus gestos meio rudes, meio desengonçados. Isso contribuiu para um protótipo de machão."

Hoje ele se vê de outra forma: "Sou um muro, mas um muro de isopor, facilmente quebrado".









O mundo já tinha tido algumas melhoras anos atrás, já tinha subido alguns degraus, mas tudo voltou, retrocedeu algumas coisas. Inclusive no direito das mulheres. Parecia que aquele boom dos anos 1970 só ia aumentar. Agora a gente nota que tem muita vontade e decisão. Precisa ter decisão, não adianta ficar teorizando. Tem que partir para o confronto. Com atitude é que você anula o marasmo de outras pessoas. Tem pessoas que querem que o mundo fique quieto porque é melhor para elas.



sobre o movimento feminista
Reprodução
Francisco Silva/AgNews

Roberto/Erasmo



Mesmo sendo um cara que evita a nostalgia, os discos de ouro pendurados na parede e os toca-discos enfileirados em uma estante estão cheias de histórias de cinco décadas, a maior parte dividida com Roberto Carlos.

Muito embora no estilo, na personalidade e nas metas, Erasmo seja uma espécie de antítese do amigo camarada, sempre avesso a entrevistas e certas cores e temas.

A parceria entre os dois, no entanto, é química rara na história da música e se tornou tão mítica quanto Lennon/McCartney. Mas uma nova composição a quatro mãos anda cada dia mais distante de acontecer.

Ele (Roberto) é preguiçoso para lançar música. Quanto mais passa o tempo mais preguiçoso ele fica. Agora com os internacionais, é tudo espanhol, eu fico fora, tô fora dessa praia.

































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