STF CADA MINISTRO É UM IMPERADOR E FAZ O QUE QUER-Colegialidade solitária Rosa Weber traiu uma minoria que, com a virada de Gilmar Mendes, se tornou maioria. Homenageia maioria que não existe mais
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Colegialidade solitária
Rosa Weber traiu uma minoria que, com a virada de Gilmar Mendes, se tornou maioria. Homenageia maioria que não existe mais
CONRADO HÜBNER MENDES
13/04/2018 - 08h01 - Atualizado 13/04/2018 08h01
Rosa Weber deixou o Brasil em suspense dez dias atrás. Sabia-se que seu voto definiria o resultado do habeas corpus de Lula ao STF (HC 152752). Por muitos anos, o STF entendeu que a pena de um condenado criminal só poderia ser executada após esgotados os recursos (o “trânsito em julgado”). Em fevereiro de 2016, a Corte alterou a posição por maioria mínima (HC 126292): seis ministros aceitaram a execução provisória da pena depois de decisão de segunda instância, em nome da efetividade do sistema penal; cinco ministros discordaram à luz do direito à presunção de inocência. Rosa Weber integrava o time dos cinco. Meses mais tarde, em duas Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs 43 e 44), permaneceu no time.
Dois anos se passaram e o plenário do tribunal não voltou ao assunto. Nesse intervalo, a ministra teve de tomar decisões monocráticas (sem consulta ao colegiado) em outros HCs sobre o tema. Optou, nesses casos, pela orientação do plenário em nome do respeito ao precedente, ainda que dele discordasse.
O HC de Lula, a pedido do relator Fachin, fez o tema voltar ao plenário em 2018. Nesses dois anos, houve uma novidade: Gilmar Mendes anunciou mudança de lado. Não nos autos, mas na mídia, como de estilo. O racha de 2016 entre maioria e minoria parecia se inverter, mas uma pergunta estava no ar: Rosa Weber seria fiel ao time que integrava no plenário de 2016, agora em maioria com a adesão de Gilmar, ou seguiria a linha de suas decisões monocráticas? Para temperar o drama, multidões nas ruas, ameaça fardada e audiência de jogo de Copa.
Após uma hora de leitura, Rosa Weber resolveu respeitar a maioria de 2016, mesmo que Gilmar Mendes dela tivesse desertado, mas deixou aberta sua posição no caso abstrato das ADCs. Boa parte do público não entendeu. Cármen Lúcia usou de estratégia: optou por pautar o HC em vez das ADCs, deixou Marco Aurélio vendido e lançou a isca para Rosa Weber.
Rosa Weber mordeu. Invocou o “princípio da colegialidade” para abrir mão de sua opinião individual e ceder à “voz institucional” da Corte. A colegialidade, virtude que o STF há muito não pratica, justifica a renúncia da opinião individual em nome de algo maior, a instituição. Requer desapego e o hábito de conjugar o “nós”, não o “eu”. Para um colegiado produzir estabilidade jurídica, é virtude fundamental.
Essa virtude, contudo, não é mecânica. Pede, caso a caso, percepção do contexto e resposta ao dilema: quando ceder minha posição à luz da maioria do colegiado? Exige, sobretudo, que membros do colegiado estejam imbuídos de reciprocidade na construção de argumentos supraindividuais. Colegialidade sem reciprocidade dos colegas é inócua: chamar de nós o que no fundo não passa de um eu envergonhado é autoengano, “colegialidade majestática”.
Rosa Weber está correta em perseguir essa virtude, mas, pelo menos no tema da presunção de inocência, faz leitura impertinente do contexto. Primeiro, porque permanecemos no calor do debate judicial sobre os contornos desse direito e a posição do STF se sustenta por maioria mínima, não por uma “voz institucional”. Não se renuncia à opinião individual quando ela é decisiva para definir quem é maioria ou minoria.
Rosa Weber traiu uma minoria que, com a virada de Gilmar Mendes, se tornou maioria. Homenageia maioria que não existe mais.
Segundo, porque, antes de deferir ao colegiado, deve contribuir à deliberação por meio de sua opinião de mérito. A ministra ainda não se posicionou sobre a presunção de inocência: no HC de 2016, filiou-se à minoria em nome da jurisprudência anterior; no HC de Lula, apelou à colegialidade. Ambas são razões formais. Não disse o que pensa em nenhuma das decisões. Se quer contribuir à interpretação constitucional, precisa apontar razões substantivas.
Quando afirma que mudança jurisprudencial requer ação abstrata, como a ADC, e não ação concreta, como o HC, ignora que o STF não segue mais esse critério. Ela mesma não o adota quando toma o HC de 2016 como base da jurisprudência atual. Estar em plenário tem sido o suficiente. E este plenário não é o reino da colegialidade, mas da estratégia.
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