PP P API DA CORRUPÇÃO VEIO DO PAIUI

PP, um partido mais que popular

Como o senador Ciro Nogueira, do Piauí, transformou o PP em um dos maiores partidos da Câmara, apesar das denúncias contra o quadrilhão da legenda 

EDUARDO BRESCIANI E MARIA LIMA
13/04/2018 - 08h02 - Atualizado 13/04/2018 08h02
Em abril de 2016, na semana em que o impeachment da presidente Dilma Rousseff foi pautado para a votação na Câmara, a petista tentou uma cartada final. Chamou ao Palácio da Alvorada o presidente do PP, senador Ciro Nogueira, do Piauí, seu aliado, para uma negociação definitiva. Nas cordas, Dilma foi direta: “Posso contar com você?”. Nogueira não titubeou: “Pode contar comigo, mas não posso perder. Se for para ganhar, minha preferência é ficar com a senhora. Mas meu partido tem de ficar do lado vencedor. Se conseguir uma nota conjunta do PSD do Gilberto Kassab e do PR do Valdemar Costa Neto, eu assino”, respondeu.
O documento nunca foi produzido. Menos de 48 horas depois, o PP, enquanto consumava uma negociação com Michel Temer em que levou os ministérios da Saúde (orçamento de R$ 130,8 bilhões), Agricultura (R$ 11,4 bilhões) e a Caixa Econômica Federal (R$ 82,1 bilhões, apenas em crédito habitacional para 2018), abandonou o governo Dilma, onde comandava o Ministério da Integração Nacional (orçamento de R$ 6,6 bilhões). Sua bancada fechou questão a favor do afastamento da presidente. A movimentação do partido, que tinha então 45 deputados em exercício, quase 10% da Câmara, mudou o status do processo de impeachment de possibilidade para fato consumado. No final, o PP entregou 38 votos contra Dilma.
O episódio mostra o estilo ultrapragmático de Nogueira e de seu partido: eles nunca entram numa barganha para perder. Descendente direto da Arena, o PP, que deve mudar o nome em breve para “Progressistas”, entrou com tudo para vencer na janela partidária — como os políticos batizaram o período de 30 dias, previsto em lei, em que podem trocar de legenda sem correr o risco de perder o mandato por infidelidade partidária. Ao final do troca-troca, encerrado na sexta-feira 6 de abril, o PP ficou entre os três maiores partidos da Câmara. Segundo as informações disponíveis até o fechamento desta edição, estava atrás do PT e disputava o 2º lugar com o MDB, desbancando partidos tradicionais como o PSDB. A legenda, segundo Nogueira, chegou a 54 deputados. Em 2015, na posse da atual legislatura, o partido tinha 38 deputados. O PP deixou assim o escalão dos partidos médios do Congresso. Nesse patamar, ele se acotovelava com PTB e PR na base do centrão — aquela massa amorfa de deputados disposta a apoiar qualquer governo em troca de cargos e acesso aos cofres públicos.
Especialista em operações de bastidores e normalmente avesso aos holofotes, Nogueira foi catapultado do baixo clero para o posto de um dos novos reis do Congresso. Para chegar a essa posição, ele e o PP aproveitaram bem os cargos que amealharam durante o governo Temer. No Ministério da Saúde, assumiu o tesoureiro do partido, o deputado paranaense Ricardo Barros. Na Caixa, o partido emplacou Gilberto Occhi, técnico que agora substitui Barros na Saúde e que já tinha sido ministro da Integração de Dilma. A legenda apadrinhou o senador Blairo Maggi, de Mato Grosso, para titular da Agricultura. No início do ano, com a debandada do PSDB da Esplanada dos Ministérios, o partido também filiou o deputado Alexandre Baldy, de Goiás, aliado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e conquistou a pasta das Cidades (orçamento de R$ 11,1 bilhões).
Com esse combo nas mãos, o PP passou a administrar programas como o Minha Casa Minha Vida, milhões de recursos para transferências aos municípios no Ministério da Saúde, além de convênios para programas sociais da Caixa Econômica — o banco público também é o responsável pela liberação de Emendas Parlamentares, outra importante moeda política. “O Ministério das Cidades define todas as políticas públicas e tem os recursos do Tesouro para toda a área de habitação, saneamento e mobilidade urbana. A Caixa Econômica cuida de toda a operacionalização desses programas sociais. Então 100% dessas ações no país estão embaixo das asas do PP. E essas são as maiores demandas de todos os 27 governadores e mais de 5 mil prefeitos do país. É muito poder”, disse um ex-ministro da pasta.
Na Saúde, medidas da gestão de Barros tornaram mais fácil o fluxo de recursos para os municípios dentro do Sistema Único de Saúde (SUS). As transferências para os municípios tinham, até então, de ser enquadradas em uma de seis modalidades disponíveis. Agora, o dinheiro é repassado com apenas dois carimbos: custeio ou investimento. Assim, o prefeito na ponta tem mais facilidade e agilidade para usar os recursos. No Congresso, deputados dizem que com esse modelo ficou ainda mais fácil faturar politicamente o dinheiro que chega às bases. E quem é do partido do ministro geralmente tem mais facilidade de conseguir os recursos. Outra ação vistosa da pasta são os mutirões de cirurgias. No ano passado, Barros conseguiu R$ 250 milhões extras para serem aplicados em cirurgias de alta e média complexidade dessa forma. Assim, a pasta começou a patrocinar mutirões Brasil afora. E os deputados do PP ganharam mais uma oportunidade de “mostrar serviço” a seus eleitores. “O Ciro dá aula de como tratar deputado. Sabe o que entregar a cada um”, disse um dos poucos deputados independentes do partido.
Ciro Nogueira com um de seus melhores amigos, o deputado maranhense André Fufuca, também conhecido como Fufuquinha (Foto: Reprodução)
Outro fator de atração do PP é que a legenda terá R$ 132 milhões do fundo eleitoral e outros R$ 50 milhões do fundo partidário para gastar neste ano. O partido, além disso, vem economizando recursos desde 2014, quando o fim do financiamento privado já vinha sendo sinalizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Juntou de lá para cá um caixa extra de cerca de R$ 100 milhões, conquistado por meio de aplicações financeiras com os recursos do fundo partidário. As eleições de 2018 serão financiadas com recursos públicos. Na negociação de troca de partido, a promessa de quanto cada legenda ofereceu foi decisiva. O teto de gastos para deputados será de R$ 2,5 milhões, e Nogueira sinalizou aos novatos que entraram no partido que vai dar a cada um deles um valor perto desse montante para a disputa da reeleição. Em conversas reservadas com outros parlamentares, deputados que se filiaram agora ao PP admitem que o farto dote para financiar suas campanhas pesou. O peemedebista Osmar Serraglio (PR) confidenciou a um deputado amigo que, sem recursos para a campanha no MDB, teve de se render ao PP de Ciro Nogueira. Procurado, Serraglio não respondeu a ÉPOCA.
Normalmente avesso a holofotes e microfones, Ciro Nogueira participa de reunião com Aécio Neves, Renan Calheiros, Rodrigo Maia e outras lideranças (Foto: AILTON DE FREITAS/AGÊNCIA O GLOBO)
A ascensão política de Nogueira e do PP do ex-prefeito Paulo Maluf se deu a despeito das denúncias que cercam o senador e o partido — um dos campeões em integrantes investigados na Operação Lava Jato e com raízes fincadas no mensalão graças à ação de ex-caciques como José Janene, Pedro Corrêa e Mário Negromonte. Investigado pela Operação Lava Jato, o próprio Nogueira foi denunciado por organização criminosa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro pela Procuradoria-Geral da República no inquérito conhecido como “quadrilhão do PP”. Na denúncia, reiterada no mês passado, a procuradora-geral, Raquel Dodge, destacou a ocupação de cargos públicos pelo partido como um mecanismo de corrupção.
“A denúncia está baseada em inúmeros e robustos elementos indicativos de que, desde 2004, os denunciados, na qualidade de membros do Partido Progressista (PP), agregaram-se ao núcleo político de uma grande organização criminosa estruturada para arrecadar, em proveito próprio e alheio, vantagens indevidas por meio da utilização de diversos órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta; tais como a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras), a Caixa Econômica Federal, o Ministério das Cidades, o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), entre outros. Para tanto, foram nomeadas, para cargos ou empregos públicos-chave, pessoas já de antemão comprometidas com a arrecadação de propina, as quais compuseram o núcleo administrativo da organização criminosa, fazendo a ponte com os empresários (núcleo econômico)”, afirmou Dodge.
Ciro Nogueira é mencionado também em diversas delações, inclusive nas mais famosas, as da Odebrecht e da JBS. Na denúncia do “quadrilhão do PP”, a PGR destacou a evolução fabulosa de doações oficiais da empreiteira que o partido recebeu sob o comando do senador piauiense. O volume saltou mais de 500%, de R$ 720 mil, em 2010, para R$ 4,4 milhões em 2014. No sistema da Odebrecht, o codinome dado a Nogueira era “Cerrado”. Em outra denúncia feita ao Supremo, o senador foi acusado de ter recebido R$ 2 milhões em propina da empreiteira UTC, de Ricardo Pessoa, sendo que parte dos pagamentos viria por escritórios de advocacia.
Em sua delação à Procuradoria-Geral da República, Joesley Batista, da JBS, disse que sua empresa pagou R$ 7 milhões ao PP pelo apoio à reeleição de Dilma em 2014 — 

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