Gogue, Magogue, Rússia, uma novela neocon e um teólogo neocon
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24 de abril de 2018 2,256 palavras
Gogue, Magogue, Rússia, uma novela neocon e um teólogo neocon
Julio Severo
A profecia bíblica é, nas mãos de escritores habilidosos, uma arte que pode trazer orientação espiritual ou desastre, quando utilizada de forma errada. Quando o presidente americano George W. Bush decidiu lançar a Guerra do Iraque, famosos pregadores de profecia bíblica disseram que tal guerra era necessária para proteger Israel. Eu me uni a eles, pois a proteção de Israel tem um lugar especial no meu coração.
Entretanto, nenhum desses mestres de profecia teve alguma profecia ou revelação das consequências da Guerra do Iraque: a matança da comunidade cristã iraquiana. Antes da guerra de Bush, a população cristã no Iraque era mais de 2 milhões. Depois da guerra, menos de 400 mil.
O Presidente Donald Trump expressou em 2016 que ele estava contra essa guerra e ele disse que Bush mentiu. Em troca, hoje Bush e toda a sua família são contra Trump.
Então como é que uma guerra, apoiada por pregadores de profecia bíblica, supostamente para proteger Israel pode trazer em suas consequências tanta matança e destruição para cristãos desprotegidos e indefesos no Iraque? Os pregadores de profecia bíblica foram irresponsáveis em suas profecias, mas ninguém lhes fez prestar contas por sua interpretação má da Bíblia.
Na década de 1970, houve uma proliferação de profecias e muitas delas colocavam os EUA numa posição privilegiada, e seus inimigos políticos ficavam com papéis bíblicos negativos. Esse padrão continua.
Numa reportagem do ChristianPost de 22 de abril de 2018 (que está parcialmente disponível no GospelPrime), o autor cristão Joel Rosenberg falou sobre “Gogue e Magogue” dizendo que essa profecia em Ezequiel estava avisando da Rússia. Ele disse que a Rússia formará uma aliança com a Turquia e atacará Israel.
“O futuro líder maligno da Rússia vai formar uma aliança com o Irã, Turquia e alguns países hostis para virem, cercarem e atacarem Israel nos últimos dias,” ele disse, acrescentando que esses acontecimentos podem ainda estar a centenas de anos no futuro. Mas seus seguidores estão levando isso a sério aqui e agora.
A opinião de Rosenberg está em sua novela mais recente “The Kremlin Conspiracy” (A Conspiração do Kremlin), que é uma ficção.
No entanto, se Rosenberg adora tanto profecia bíblica, por que ele não dá atenção a uma profecia bíblica importante de David Wilkerson, que disse que os EUA são a Babilônia?
Independente das interpretações do futuro dos EUA e da Rússia, Trump, que em 2016 queria uma parceria com a Rússia contra o terrorismo islâmico, era um político muito bom, ainda que Rosenberg o visse como “catastrófico.” E Putin é um político muito bom em seu exemplo de luta contra a agenda gay e contra o ISIS.
O contexto inconveniente que não é ficção na profecia fictícia na novela de Rosenberg é que a Turquia tem uma aliança real — com os EUA e a OTAN.
O que não é ficção são as tendências neocons nas opiniões dele. Por exemplo, Rosenberg disse: “Vladimir Putin é mais perigoso para os Estados Unidos e nosso modo de vida do que o islamismo radical.” Essa é a opinião exata dos neocons. Em 2016 George Soros publicou um artigo intitulado “Putin é uma ameaça maior à existência da Europa do que o ISIS.” Enquanto Soros é um judeu-americano esquerdista neocon, Rosenberg é um judeu-americano cristão neocon. Diferentes, mas de mentalidade igual.
“The Kremlin Conspiracy,” conforme o próprio Rosenberg reconheceu em seu livro, teve a assistência fundamental do senador Lindsey Graham. O senador John McCain e Graham são os dois principais neocons anti-Rússia no Congresso dos EUA. Dizer neocon anti-Rússia é uma redundância, pois todos os neocons são contra a Rússia.
Graham, que incessantemente quer guerra com a Rússia, estava contra Trump em 2016 por seus discursos anti-neocons. Graham e McCain receberam financiamento de Soros.
Então a novela de Rosenberg é essencialmente neocon. Foi publicada em 2018 por Tyndale House Publishers, uma editora evangélica proeminente. A ideologia neoconservadora (neocon), com algum adorno teológico, está ficando normal entre evangélicos americanos.
Não só acerca de Putin Rosenberg tem sentimentos “proféticos” negativos. Ele disse em 2016 que Trump seria catástrofe absoluta como presidente. Não diferente dos neocons. Em 2016, na revista Commentary, o historiador neocon Max Boot escreveu, um tanto quanto exagerado, que Trump é “a ameaça número 1 para a segurança dos EUA” — maior do que o Estado Islâmico ou a China.
Então, na visão neocon, tanto Putin quanto Trump em 2016 eram um ameaça maior do que o ISIS!
Em contraste, Franklin Graham, que é o filho do evangelista Billy Graham, disse no ano passado: “Os meios de comunicação e os inimigos do presidente Trump estão tentando causar problemas e divisões entre Rússia e Estados Unidos. Os EUA precisam da Rússia como aliada na luta contra o terrorismo islâmico. Junte-se a mim e oremos pelo presidente Trump e pelo presidente Vladimir Putin.”
Não só os meios de comunicação, rotulados apropriadamente por Trump como Mídia de Notícias Falsas, mas pregadores de profecia bíblica irresponsáveis se uniram aos neocons para causar tais problemas e divisões.
Logo que Trump abandonou seus discursos de 2016 de parceria com a Rússia contra o terrorismo islâmico, os neocons e Joel Rosenberg reverteram curso e pararam de criticá-lo. Agora que Trump tem continuado a política neocon tradicional de parceria com o islamismo contra a Rússia, Lindsey Graham, John McCain e Rosenberg estão satisfeitos.
Ainda que a maioria dos neocons cristãos seja católica, há alguns proeminentes neocons protestantes, inclusive Hillary Clinton. Rosenberg é também um deles.
Enquanto Rosenberg usa seus sentimentos neocons para interpretar a profecia bíblica, escrevendo novelas e ficções que são tratadas como realidade e não ficção, realidade é realidade. Os Estados Unidos, a maior nação protestante do mundo, tratam a Arábia Saudita como amiga, enquanto a ditadura saudita persegue cristãos.
A Turquia, outro aliado dos EUA, tem mantido um pastor americano preso desde outubro de 2016 acusado de ter ajudado grupos terroristas.
É uma afronta imensa a Turquia prender um pastor evangélico da nação que lidera a OTAN, pois a presença da Turquia na OTAN foi um privilégio exclusivamente — e imerecidamente — concedido pelos Estados Unidos. A Turquia é radicalmente islâmica e seus valores são contrários, em religião e história, aos valores cristãos da Europa e Estados Unidos. Não existe nenhuma justificativa para a Turquia ser membro da OTAN e aliada dos EUA.
Entretanto, não é só o ataque da Turquia a um pastor inocente que prova que a Turquia não merece ser aliada de nações cristãs.
No mês passado, Erdogan disse que Israel é “um Estado terrorista” e que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu é “um terrorista” por causa de esforços defensivos de Israel contra os terroristas palestinos. A Turquia tem financiado e armado o Hamas contra Israel e, com a Arábia Saudita, tem financiado e armado grupos terroristas islâmicos, inclusive o ISIS, contra o governo sírio. Isso é terrorismo real. Como é que a Turquia islâmica pode hipocritamente acusar Israel de terrorismo?
Um dos maiores genocídios modernos de cristãos foi cometido pela Turquia. Cerca de 100 anos atrás na Turquia, um número estimado de 1,5 milhão de cristãos armênios em 66 cidades e 2.500 vilas foram massacrados; 2.350 igrejas e monastérios foram saqueados e 1.500 escolas e colégios foram destruídos. Apesar disso, para aplacar a ira da Turquia, Trump tem evitado dizer que o Genocídio Armênio foi genocídio. Israel, que todo ano acertadamente comemora o Holocausto, também tem evitado reconhecer o Genocídio Armênio, ainda que cristãos evangélicos estejam trabalhando muito para pressionar as nações a reconhecer o Holocausto. Tanto os EUA quanto Israel não reconhecem o Genocídio Armênio porque os muçulmanos turcos odeiam ouvir sobre seus crimes contra os cristãos.
Por essas razões óbvias, a Turquia representa preocupações para os cristãos, que olham também para fatos históricos com relação à violência da Turquia contra cristãos e judeus.
Hagia Sophia, a maior e mais antiga catedral cristã do mundo, foi conquistada pelos muçulmanos em 1453 em Constantinopla, o nome cristão da atual cidade islâmica de Istambul, Turquia. Uma civilização cristã foi destruída por invasores islâmicos que transformaram a terra cristã — a terra das sete igrejas do Apocalipse — na Turquia.
Não só uma terra tradicionalmente cristã foi conquistada, mas também a terra de Israel.
De 1517 a 1917, a Turquia — que era então o Império Otomano — conquistou e possuiu a Terra Prometida. Isto é, durante quatro séculos a terra de Israel esteve sob controle islâmico. Então quando a Bíblia fala de Gogue e Magogue vindo do Norte e conquistando Israel, isso era a Turquia, que está no Norte de Israel, e possuiu a terra de Israel por séculos.
Aliás, acadêmicos judeus e cristãos apontaram para a Turquia como Gogue e Magogue, conforme o escritor evangélico Joel Richardson mostrou:
Hipólito de Roma (170–235), um teólogo cristão primitivo, em suas crônicas, conectou Magogue com os gálatas na Ásia Menor, ou Turquia moderna.
Moisés Ben Maimônides (também conhecido como Rambam) (1135–1204), o reverenciado mito judeu, em Hichot Terumot, identificava Magogue como estando na fronteira da Síria e moderna Turquia.
Nicolau de Lira (1270–1349), um estudioso hebreu e renomado exegeta bíblico, cria que Gogue era outro título do Anticristo. Lira também afirmou que a religião dos “turcos,” um termo usado para se referir aos muçulmanos em geral, era a religião do Anticristo.
Martinho Lutero (1483–1546) compreendia que Gogue era uma referência aos turcos, os quais Deus havia enviado como flagelo para castigar os cristãos.
Sir Walter Raleigh (1554–1618), em sua História do Mundo, também colocava Magogue na Ásia Menor, ou Turquia moderna.
John Wesley (1703–1755), em suas Notas Explicativas sobre Ezequiel 38 e 39, identificava as hordas de Gogue e Magogue com “as forças do Anticristo” que viriam da região da moderna Turquia.
Jonathan Edwards (1703–1758), um dos mais renomados teólogos da história americana, também via a Turquia moderna como a nação que traria a invasão de Gogue e Magogue.
Os neocons têm suas razões geopolíticas para tratar a Rússia, não as ditaduras islâmicas da Turquia e Arábia Saudita, como o inimigo número 1. Mas por que Joel Rosenberg escolheu interpretar as profecias bíblicas de um jeito que se encaixa na geopolítica neocon? Por que ele recebeu assistência fundamental do neocon Lindsey Graham para produzir um livro contra a Rússia?
Por que os Estados Unidos alistaram o verdadeiro Gogue e Magogue — que trata um pastor evangélico e Israel como “terroristas” e que matou 1,5 milhão de cristãos armênios — como membro da OTAN e seu aliado? Para vir do Norte e conquistar Israel de novo? Para vir do Norte e conquistar cristãos e tratá-los como “terroristas” de novo? Para matar cristãos, como no Genocídio Armênio e na Síria por meio de grupos terroristas islâmicos?
A Turquia tem um perfil profético que não só se encaixa em Gogue e Magogue, mas também como uma grande ameaça aos cristãos e Israel nos últimos dias.
Minha pergunta é: Por que os evangélicos americanos estão deixando neocons protestantes como Rosenberg guiá-los no plano geopolítico e belicista maior de neocons não-cristãos?
Todos os neocons, inclusive Rosenberg, achavam em 2016 que Trump seria catastrófico. É claro que ele seria catastrófico: só para os neocons e suas ambições belicistas e profecias bíblicas manipuladas.
Os EUA precisam desesperadamente de um presidente catastrófico para os neocons.
Com informações do WorldNetDaily.
Versão em inglês deste artigo: Gog, Magog, Russia, a Neocon Novel and a Neocon Theologian
Fonte: www.juliosevero.com
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