Os dois 4 de abril


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Antonio Carlos Prado é editor executivo da revista ISTOÉ



Os dois 4 de abril



Na quarta-feira, dia 4 de abril, completa-se meio século da morte de Martin Luther King, covardemente assassinado em Memphis, no Tennessee. Assim calaram a voz — mas não o sonho e muito menos a consequência real desse mesmo sonho — do reverendo Luther King, o principal líder negro dos EUA na década de 1960, a lutar, incansavelmente e dentro das regras legais, pela democracia racial em seu país. Martin Luther King fez de sua atuação e de seu ativismo contra o preconceito uma reivindicação bem mais abrangente e definitiva: lutou pelos direitos civis dos negros porque, é claro, no interior da isonomia social, política e jurídica com os brancos estava o segredo do sucesso de seus objetivos. Estava a legalidade a sustentar a legitimidade de todos serem iguais perante as regras da Justiça. O símbolo maior da jornada de Martin Luther King deu-se no dia 28 de agosto de 1963, quando esse incansável líder negro, seguido por um mar de gente (inclusive brancos), marchou sobre Washington D.C e, no Lincoln Memorial, proferiu um dos mais iluminados discursos já feitos por um líder: “I have a dream” (“Eu tenho um sonho”).

Na quarta-feira, dia 4 de abril, o STF deve se reunir com a finalidade de julgar o habeas corpus de Lula da Silva. Junte-se os dois 4 de abril, o dos cinquenta anos da morte de Luther King e o da sessão do STF, e nos vem à lembrança um outro homem, também com carisma de líder, também negro, também rígido seguidor de leis e da Constituição, também trabalhador incansável. Um homem que já integrou o STF e que, infelizmente, lá não mais se encontra. Graças a Deus, esse homem está vivo. Mas bem que poderia ainda enobrecer a Corte… falo, sim, de Joaquim Barbosa.

Há, além do caráter e da retidão de princípios, outro ponto que aproxima Luther King e Joaquim Barbosa: a disposição para o trabalho, o não cansaço na luta pelos ideais. Falou-se da concentração no Lincoln Memorial. Registra a história que o reverendo acordou com a saúde combalida naquele dia. Deixar o cansaço abater o espírito? Jamais. Lá foi ele com o seu “I have a dream”. Quanto a Joaquim Barbosa, o acompanhamos durante o julgamento da ação penal 470 (mensalão): sessões intermináveis, e ele, o relator do processo, com dores lancinantes nas costas, mantinha-se firme na função de bem servir a sociedade — às vezes em pé, às vezes apoiando-se no espaldar de sua cadeira de ministro, às vezes andando. Jamais alegou canseira para suspender sessões. Tentemos imaginar: Luther King cansado, adiando discurso; Joaquim Barbosa cansado e com dor, adiando sessões. Imagina! A alma da Justiça e a alma do respeito à sociedade habitaram e habitam esses dois homens.

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