Martinho Lutero: Um homem sábio

Martinho Lutero: Um homem sábio

CRÔNICA18 de Jan de 2018 - 19h25, atualizado às 09h13
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WOLFGANG TESKE
É jornalista, teólogo e professor universitário em Palmas
professorteskeuft@gmail.com
Ao ler, estudar e analisar as obras escritas pelo doutor Martinho Lutero, no século 16, é possível concluir que o reformador da igreja, não foi uma pessoa comum, era um sábio, com certeza. Sábio é definido como alguém extremamente inteligente, com um vasto conhecimento e que o utiliza de forma prática. Dito de outro modo, sábio é um filósofo prático, que consegue discernir verdades universais que dizem respeito à natureza humana, bem como, percebe e distingue verdades e falsidades particulares de indivíduos e da própria sociedade. O ensinamento de um sábio sempre é desafiador, inquietante e surpreende aos que o ouvem, e, por esta razão, o sábio normalmente se antecipa ao pensamento comum de sua época, tornando-se pioneiro e libertador.

Lutero mostrou ser sábio, ao saber utilizar e aplicar todo o seu conhecimento para ensinar, alertar, repreender e defender-se de acusações e ameaças sem fundamento. Um dos exemplos da habilidade e sabedoria do doutor Martinho Lutero é a resposta que ele deu ao monge dominicano Ambrósio Catarino, um dos primeiros e mais influentes adversários italianos da Reforma Protestante, e que havia escrito e publicado, em 1520, na cidade de Florença, Itália, a Defesa da verdade e da fé e da doutrina católica contra as afirmações teológicas ateias e muito pestíferas de Martinho Lutero. A resposta de Lutero se dá em forma de um livro, escrito não em alemão, mas em latim, no qual recorre a histórias relatadas no Antigo Testamento, da Igreja Cristã, dos gregos, dos romanos, da filosofia, da conjuntura política, social, religiosa e cultural de sua época, e não apenas de sua região, mas de toda a Europa. Utiliza figuras de linguagem como a metáfora e também um dos gêneros da literatura que é a sátira, principalmente, quando ridiculariza os pseudointelectuais.

Enquanto a argumentação de Catarino se limitava em afirmações sem fundamento teológico, nem histórico ou filosófico, Lutero demonstra ser um intelectual erudito que não tolera asneiras. No início de sua argumentação, afirma que a base teológica de seu adversário é tomista, ancorada em Tomás de Aquino que, no século 13, tinha escrito sua maior obra, a Summa Theologica, o principal documento da igreja medieval. Refere-se aos tomistas como enganadores e cita a história do cavalo de Tróia, utilizado pelos gregos para enganar os troianos, quando estes julgaram ter recebido um presente que representava a vitória, e, na realidade, foi símbolo de sua derrota. Para ilustrar, recorre a uma metáfora, ao escrever: - "É verdade que um tomista puro é um verdadeiro asno, seja ele italiano, seja alemão".

Lutero, em sua argumentação, demonstrando conhecimento sobre as correntes filosófico-teológicas, menciona algumas, que, segundo ele, conflitavam com a doutrina 
cristã, tais como: a dos escotistas, iniciada no século 13, pelo franciscano escocês João Duns Escoto; a dos modernos, adeptos do nominalismo, criada no século 14, pelo franciscano inglês Guilherme de Occam; a dos albertistas, iniciada pelo dominicano alemão Alberto Magno, no final do século 12. Lutero também deixa claro neste seu livro contra Catarino, que conhece muito bem o filósofo grego Aristóteles da antiguidade, que se tornou base para os teólogos a partir de Tomás de Aquino. Também menciona Porfírio, um filósofo neoplatônico e inimigo do cristianismo, que, no terceiro século da era cristã, se tornou conhecido pela criação da árvore de Porfírio, uma representação filosófica que iniciava com a conceituação da substancia até chegar ao conceito do ser humano. Lutero se indignara por ter sido considerado uma besta por Ambrósio Catarino, e então recorre à sátira e ao deboche para desmascarar o seu opositor afirmando que este era um homem laborioso, talentoso, mas tinha um espírito medíocre, e que fazia comentários espantosamente estúpidos, ridículos, burros e acrescenta: - "Eu vou dizer uma palavra nova e que deve ser dita, palavra essa que o inteligente Catarino jamais teria percebido, ainda se tivesse devorado a árvore de Porfírio juntamente com suas frutas".

Ao rebater ponto por ponto todas as acusações, Lutero demonstra conhecer muito bem a história da Igreja Cristã, destacando as doutrinas que fundamentavam a fé cristã e seus líderes, também conhecidos como os pais da Igreja, tais como: Orígenes, considerado o mais importante teólogo da Igreja Antiga, entre os anos de 185-254, e João Crisóstomo, bispo de Constantinopla e maior pregador da Igreja Antiga de fala grega, nos anos 354-407.

Lutero adverte o seu acusador, para que discuta sempre fundamentado nos conceitos e na doutrina baseada nas Escrituras, ao afirmar: - "Gritaria não anula argumentos, nem a alegação de inconveniência. Anula primeiro as objeções, e depois clama". E ainda ensina a Catarino como se deve travar uma disputa intelectual e acadêmica: - "Ouves Catarino? Não tentes provar a premissa maior, mas, sim, a menor, para que não trabalhes em vão, mas com proveito. Enquanto não tiveres provado isso, não poderás persistir em tua conclusão".

Livro de Ambrósio Catarino contra Marinho Lutero
Lutero compara a gritaria de Catarino aos personagens da mitologia da Grécia Antiga como Proteu, uma das divindades, célebre pelas suas constantes transformações, e da mitologia ítalo-romana como Vertumo, divindade da mobilidade que envelhecia e rejuvenescia ao ritmo das estações. Para Lutero, discutir com uma pessoa com este tipo de comportamento, é perda de tempo e é taxativo ao afirmar: - "Nem por um instante sequer esta cabeça estúpida, indigna do sangue e do nome italiano, se apercebe que com esta inconstância e mobilidade nada prova". E dá razões para ser tão forte em suas declarações contra Catarino, com mais uma metáfora - "E porque o asno não serve para tocar a lira, como diz o adágio, tenho que usar uma filosofia grosseira diante de uma cabeça grosseira constipada". Querer vencer uma disputa intelectual não pode ocorrer com gritaria, ou seja, com palavras jogadas ao vento, pois poderá ser confundido com Baco, deus do vinho na mitologia grega e com os Coribantes, que na Frígia, região da antiga Ásia Menor, eram sacerdotes da deus Cibele, que nos seus êxtases sagrados executavam danças e conduziam seus cultos em ritos de orgia, acompanhados por gritos selvagens e música ao som de flautas, címbalos e tamborins.

Lutero também confronta Catarino com a questão da preocupação da igreja medieval em adquirir cada vez mais bens materiais e propriedades, considerados bens eclesiásticos, pois este tipo de ação não tinha o objetivo de glorificar, nem melhorar e fortalecer a Igreja Cristã e afirmou: - "O luxo dos persas é, na verdade, ridículo e a opulência dos romanos se torna pequena, se consideras esses mares e rios de ouro e prata. Ms onde se aplicas tudo isso? A que necessidades são destinadas? Aos pobres e miseráveis? Nada disso! Antes vão para Sodoma e Gomorra e Síbalis". Neste ponto, Lutero traça paralelos com histórias dos povos antigos como a dos persas, do Império Romano, das histórias relatadas no Antigo Testamento como as de Sodoma e Gomorra e ainda as associa a Síbalis, que foi uma colônia agrícola fundada por gregos por volta de 700 a.C., no sul da Itália, que alcançou grande prosperidade, entretanto os seus habitantes viviam em completa luxúria.

Neste livro-resposta enviado a Ambrósio Catarino, Lutero detalha a trajetória dos acentuados desvios da 
Cérbero, figura da mitologia grega
Igreja Cristã a partir de Tomás de Aquino, que introduzira a filosofia de Aristóteles no mundo cristão. Um de seus discípulos foi Alexandre de Hales, que aplicou este tipo de ensinamento nas universidades, chegando a comparar Aristóteles com Jesus Cristo, fazendo com que a fé e verdades cristãs fossem substituídas pelas virtudes morais e uma infinidade de opiniões filosóficas. Diante desse fato argumenta: - "Mas é certo que o Aristóteles morto e condenado é hoje o mestre de todas as universidades mais do que Cristo. Posto no pedestal pela autoridade e esforço de Tomás, ele reina, sendo um Cérbero de três cabeças, sim um Gerião de três corpos". Lutero novamente recorre a figuras da mitologia grega em sua comparação.

Em seu livro ainda usa muitas outras figuras de linguagem, comparações e analogias, demonstrando um alto grau de percepção e conhecimento geral. O que chama a atenção é que este livro foi escrito quando não havia computador, Internet e possibilidade de pesquisas em sites de busca. Este livro, que atualmente compreende uma obra com quase cem páginas impressas, foi todo manuscrito pelo reformador e posteriormente impresso. Lutero, sem dúvida, foi um sábio que soube aplicar o conhecimento para transformar a sociedade.

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