Fortalecimento da bancada ruralista com crise política deixa Amazônia vulnerável, diz Financial Times
Fortalecimento da bancada ruralista com crise política deixa Amazônia vulnerável, diz Financial Times
17 janeiro 2018
Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionBrasil reduziu em 83% a taxa de desmatamento entre 2004 e 2012, mas, desde então, a área desmatada voltou a crescer
Principal jornal de finanças da Europa, o britânico Financial Times afirma em reportagem publicada neta quarta-feira que "a Amazônia parece novamente vulnerável", diante da crise política que o Brasil atravessa.
No material de página inteira, o jornal narra as dificuldades da fiscalização de conter atividades ilegais como desmatamento e a mineração na região. Salienta ainda que a crise política e o cenário eleitoral incerto, além da força dos ruralistas, também colocam em risco a Amazônia.
"Por causa da incerteza política depois do impeachment e da saída da presidente Dilma Rousseff em 2016, e com o Brasil encarando as eleições mais imprevisíveis da década, a Amazônia parece novamente vulnerável", diz a publicação.
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O jornal observa que o presidente eleito em 2018 vai enfrentar um Congresso extremamente fragmentado e com forças conservadoras que exercem influência dentro e fora do Parlamento.
O Financial Times cita a "força formidável" das "bancadas do boi, da bala e da Bíblia" no Congresso, numa referência à frente ruralista, à que defende medidas mais severas na área de segurança pública e à evangélica, que geralmente atuam juntas.
"O nível de desmatamento na Amazônia caiu desde que atingiu o pico em 2004, mas muitos políticos não querem adotar uma posição mais firme na questão ambiental. Áreas intocadas permanecem vulneráveis ao forte lobby", destacou a publicação britânica.Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionJornal britânico destaca a força da bancada ruralista, que não perdeu influência no governo de Michel Temer
A reportagem diz ainda que a força dos ruralistas, que comandam 46% da Câmara dos Deputados e mais de um quarto do Senado, ajudou, inclusive, a manter o presidente Michel Temer no cargo.
"Acusado de corrupção em maio deste ano, ele sobreviveu a duas votações no Congresso para decidir se ele seria processado (no Supremo Tribunal Federal), em parte por causa da ajuda dos ruralistas", afirma o texto.
O jornal afirma ainda que críticos apontam que o presidente, em troca, tem tentado passar uma série leis que, segundo ambientalistas, beneficiam fazendeiros e mineradoras.
Defesa
"Em sua defesa, o governo Temer argumenta que o desmatamento caiu no último ano. Fiscais do Ibama e do Ministério do Meio Ambiente reconhecem, em privado, os esforços do ministro José Sarney Filho em trabalhar nos bastidores contra as piores medidas demandadas pelo Congresso", argumenta o Financial Times.
Ao jornal, Sarney Filho disse que é importante fazer com que as pessoas estejam cientes de que a floresta vale mais se não for cortada. Os ruralistas afirmam que são contra o desmatamento ilegal.
Em entrevista ao Financial Times, o líder da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), criticou os que, na sua visão, se dizem ambientalistas, mas "vivem em apartamento com televisão e internet". "Quem mais protege a floresta são os produtores", disse.Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionFinancial Times: 'criminosos estão altamente organizados, bem armados e motivados, em especial os grileiros'
Segundo o jornal, 95% do desmatamento na Amazônia é ilegal, sendo a pecuária responsável por 80% do corte de árvores sem autorização.
"Enquanto o desmatamento no Brasil permanece bem abaixo do pico registrado em 2004, quando uma área equivalente à Macedônia foi jogada no chão, a atividade aumentou desde 2012."
Para o Financial Times, até 2012 o Brasil parecia estar no caminho certo para cumprir a meta internacional de desmatamento ilegal zero em 2030. Com o esforço, afirma a publicação, o país reduziu em 83% a taxa de desmatamento entre 2004 e aquele ano. Mas, desde então, a área desmatada veio crescendo.
Problemas na fiscalização
O jornal diz que a luta contra crimes ambientais na Amazônia continua, mas ressalta o pessimismo de agentes que estão na linha de frente, atuando em áreas de preservação e combatendo atividades ilegais.
Afirma ainda que relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) indica o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) viu o número de agentes de fiscalização cair 26% entre 2010 e 2016.
"Os criminosos, por sua vez, estão altamente organizados, bem armados e motivados, em especial os grileiros."Direito de imagemGETTY IMAGESImage captionFinancial Times cita relatório da CGU que indicou redução de 26% no número de fiscais do Ibama no país
O Financial Times citou ainda o caso dos funcionários do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Ibama, que atuavam em Humaitá, no sul do Amazonas, e foram obrigados a deixar a cidade depois que as sedes dos dois órgãos foram incendiadas.
A suspeita é que o incêndio criminoso tenha sido provocado por garimpeiros insatisfeitos com uma operação contra mineração ilegal.
Depois do incidente em Humaitá, segundo o jornal, alguns garimpeiros tiveram a ajuda do governo do Amazonas para legalizar suas atividades - e que o Ministério Público Federal está processando muitos dos que ganharam essas licenças.
"Pesquisas de opinião indicam que muitos brasileiros apoiam esforços de conservação ambiental. Ainda assim, autoridades na linha de frente dizem que caso as eleições não selecionem políticos dispostos a ter uma atuação mais dura contra o desmatamento, o futuro a médio prazo é sombrio."
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