Ao contrário do que diz Amastha, cartório mostra relação de decreto de desapropriações com o BRT Para o advogado do prefeito na Operação Nosotros, da PF, a alteração nos registros se deve a "um erro no cartório"
Ao contrário do que diz Amastha, cartório mostra relação de decreto de desapropriações com o BRT
Para o advogado do prefeito na Operação Nosotros, da PF, a alteração nos registros se deve a "um erro no cartório"
LAILTON COSTA, ESPECIAL PARA O CT19 de Jan de 2018 - 08h03, atualizado às 08h47
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Prefeito Carlos Amastha e os secretários indiciados pela PF por associação criminosa, corrupção passiva e excesso de exação (cobrança sem base legal)
A comparação entre o teor de uma certidão cartorária datada de 13 de setembro de 2016, referente às áreas públicas que originaram a Operação Nosotros, da Polícia Federal (PF), com outras duas emitidas após a operação ser desencadeada, no dia 10 de novembro daquele ano, mostra que houve alteração retroativa, no registro oficial da área, para desvincular o Decreto de Desapropriação nº 930 da implantação do sistema Bus Rapid Transit (BRT).
A não vinculação do decreto e o BRT é uma das linhas de defesa do prefeito de Palmas, Carlos Amastha (PSB), contra o indiciamento do gestor e mais e quatro secretários por associação criminosa, corrupção passiva e excesso de exação (cobrança sem base legal), pelo delegado da Polícia Federal Júlio Mitsuo Fujiki no relatório final da operação.
A argumentação aparece ao lado de outras alegações da defesa, em um pedido formal para o arquivamento da investigação apresentado ao procurador da República Bruno Caiado de Acioli, em 18 de dezembro de 2017. Nele, o advogado Leandro Manzano contesta a conclusão do inquérito policial negando, categoricamente, que a desapropriação contida no decreto teria a destinação de implantar ao sistema BRT. “Com a devida vênia, totalmente equivocada, por não possuir qualquer impacto com o sistema Bus Rapid Transit (BRT), visto que seu traçado se encontra a quilômetros de distância da área”, escreve o advogado.
Elo
Contudo, não é o que atesta uma certidão emitida pelo Cartório do Registro de Imóveis no dia 13 de setembro de 2016, quase dois meses antes da operação da PF. Nesse documento, o oficial substituto João Batista Campos faz a seguinte anotação: “Certifico ainda para conhecimento de terceiros, constar ofício Nº 1406/2014 GAB/PGM, datado de 12 dezembro de 2014, notificando a existência do decreto de declaração de utilidade pública Nº 930, de 11 de dezembro de 2014, para fins de desapropriação das áreas destinadas a implantação e construção do projeto "Bus Rapid Transit=BRT no município de Palmas".
Certidão antes da operação mostra BRT entre os objetivos da desapropriação
No pedido de arquivamento do inquérito, porém, a defesa se sustenta no teor de outra certidão, datada de 9 de dezembro de 2016, um mês após a operação ter sido deflagrada pela PF. O documento mostra que houve um ofício da Procuradoria Geral do Município(PGM) naquele ano, com o pedido de retificação da certificação anterior, junto ao Cartório do Registro de Imóveis. A intervenção da Prefeitura deixou a certidão na mesma linha que a defesa do gestor adotou no final da investigação, ao excluir a menção ao BRT, entre os objetivos do decreto de desapropriação.
Certidão emitida durante operação da PF mostra intervenção da PGM para excluir elo com o BRT de documento do cartório
“Certifico ainda para conhecimento de terceiros, constar ofício Nº 1406/2014 GAB/PGM, datado de 12 dezembro de 2014, e ofício 551/2016-PGM/GAB, que solicita retificação da certificação que era epigrafada na emissão de certidão do presente imóvel- a qual era equivocada em virtude de erro material devido a confusão humana com a centena de outros imóveis que estão envolvidos com o BRT - uma vez que o aludido decreto não faz referência ao BRT e apresenta a seguinte ementa em seu cabeçalho "Declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, áreas de terras situadas em Palmas, Estado do Tocantins, destinadas ao desenvolvimento urbano, através de ocupação ordenada, em consonância às regras de postura, à melhoria do sistema viário e sistema de transporte urbano e fluvial e a consolidação da área de lazer e cultura - ALC deste município, e adota outras providências".
Retificada
Numa terceira certidão obtida pelo CT, datada do dia 21 de novembro de 2017, quando o relatório da PF entrava na reta final, o mesmo trecho aparece sem mencionar a intervenção feita pela PGM, em 2016, no registro, como se o teor fosse o mesmo de 2014, quando houve a primeira manifestação da prefeitura pedindo a averbação do decreto de desapropriação.
A certidão passa a ser assim: “Certifico ainda para conhecimento de terceiros, constar ofício Nº 1406/2014 GAB/PGM, datado de 12 dezembro de 2014, notificando a existência do decreto de declaração de utilidade pública Nº 930, de 11 de dezembro de 2014, que declara de utilidade pública, para fins de desapropriação, áreas de terras situadas em Palmas, Estado do Tocantins, destinadas ao desenvolvimento urbano, através de ocupação ordenada, em consonância às regras de postura, à melhoria do sistema viário e sistema de transporte urbano e fluvial e a consolidação da área de lazer e cultura - ALC deste município, e adota outras providências".
Certidão emitida ao final da operação mostra texto sem a intervenção da PGM e sem elo com o BRT
Defesa
Em nota enviada ao CT, Manzano frisa que o Município de Palmas, ao oficiar o Cartório de Registro de Imóveis, em 2014, para averbar nas margens das matrículas dos imóveis o teor do Decreto de Desapropriação nº 930 “em nenhum momento solicitou que o fizesse como sendo desapropriação com a finalidade de implantação e construção do projeto ‘Bus Rapid Transit’.
Ele também pontua que o próprio decreto, em nenhum momento “mencionou implantação do BRT” e ressalta que na edição de outros decretos de desapropriação para a “finalidade específica de implantação e construção do projeto ‘BRT’, isto era feito de “forma expressa no ato administrativo”.
Ofício da PGM em 2014 que pede a averbação nas matrículas dos imóveis
Erro do cartório
Para o advogado, a alteração nos registros cartorários, relatada nesta matéria, se deve a um erro no cartório. “Devido ao Município ter editados outros Decretos de desapropriação, sendo especificamente e expressamente com a finalidade de implantação e construção do projeto “Bus Rapid Transit” – BRT, houve um erro no momento da averbação ao certificar que o Decreto de desapropriação nº 930, em que recaiu nas matrículas nº M-22.099 e M-20.338, seria com a finalidade de implantação e construção do projeto “Bus Rapid Transit” – BRT”, reforça Manzano.
“Diante disso, a Procuradoria Geral do Município oficiou o Cartório (ofício PGM nº 551/2016) para proceder à devida retificação, o que fora realizada, e, hodiernamente, averbada nas margens das matrículas nº M-22.099 e M-20.338”, finaliza a nota, cuja íntegra pode ser conferida ao final do texto.
Indiciados
O prefeito de Palmas, Carlos Amastha (PSB), o procurador-geral do município, Públio Borges; o subprefeito da Região Sul, Adir Gentil; o secretário de Planejamento e Desenvolvimento Urbano, Cláudio Schuller; além de cinco empresários foram indiciados em relatório da Operação Nosotros assinado pelo delegado da Polícia Federal Júlio Mitsuo Fujiki.
A Polícia Federal aponta uma “associação criminosa” instalada na Prefeitura de Palmas com o objetivo de “lucrar com as valorizações em terrenos decorrentes das obras do BRT”. Segundo o relatório, empresários municiados de informações privilegiadas sobre a futura instalação do novo sistema de transporte, contrataram projeto urbanístico “masterplan” para a área que seria beneficiada pelas obras, alvo de Decreto de Utilidade do Paço. Uma cláusula no contrato da elaboração do projeto condiciona o pagamento de determinadas parcelas do projeto à revogação do Decreto de Utilidade Pública.
Um dos proprietários que estariam sendo pressionados pela suposta quadrilha, o advogado Egon Just, chegou a gravar uma conversa com o prefeito Carlos Amastha. O documento da Polícia Federal cita o áudio da reunião com Just, devedor de altas quantias de Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). Nele, o prefeito teria dito: “Você me acerta a vida e a gente levanta imediatamente [o ato de desapropriação da área]”. O entendimento do delegado federal Júlio Mitsuo Fujiki é que a fala de Amastha é uma referência ao IPTU devido. “Tal fato, por si só, já configura o crime de excesso de exação [cobrança sem base legal]”, conclui Fujiki.
- Confira a íntegra da nota da defesa do prefeito Carlos Amastha
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