Crise no Zimbábue expõe papel dúbio da China no continente africano


Crise no Zimbábue expõe papel dúbio da China no continente africano


CHARLES CLOVER
EMILY FENG
DAVID PILLING
DO "FINANCIAL TIMES"22/11/2017 02h00
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Quando o dirigente chinês, Xi Jinping, chegou a Harare para uma visita de Estado dois anos atrás, desceu do avião e trocou um aperto de mãos que durou minutos com Robert Mugabe, em um gesto caloroso que ecoou em toda a África.

Pequim manteve seu apoio ao ditador do Zimbábuedesde que o partido Zanu-PF pôs fim ao domínio da minoria branca em 1980, e ao longo de todo o período de sanções iniciado em 2002, quando o regime organizou a tomada violenta de terras que eram propriedade de brancos.
Ng Han Guan - 25.ago.2014/Associated Press

O dirigente chinês, Xi Jinping, recebe o então ditador do Zimbábue Robert Mugabe em Pequim


"[Xi] claramente tinha um relacionamento pessoal, e não apenas político e militar, com Mugabe", disse Hannah Ryder, fundadora da consultoria Development Reimagined.

Agora o ditador está em prisão domiciliar em Harare, e o papel da China na África volta volta a ganhar destaque. O general Constantino Chiwenga, comandante das forças de defesa do Zimbábue e arquiteto da tomada de poder pelos militares na semana passada, esteve em Pequim dias antes de voltar para casa e ordenar que os soldados ocupassem as ruas da capital zimbabuana.

Notícias sobre a viagem do general alimentaram reportagens de que a China havia sido avisada com antecedência sobre a operação. Pequim descartou zangadamente as especulações, esta semana, afirmando que eram prova das "más intenções da mídia ocidental", de "promover o afastamento" entre a China e a África.

Luke Patey, pesquisador sênior do Instituto Dinamarquês de Estudos Internacionais, disse que, até o momento, existem poucas indicações de que Pequim tenha influenciado diretamente a ação, e que "não devemos exagerar o papel concreto da China".

"Ao mesmo tempo, Pequim não atrapalhou", ele acrescentou, dando a entender que o ditador, cada vez mais errático aos 93 anos, pode ter passado a ser visto como problema. "Mugabe claramente perdeu o favor dos chineses".

A renúncia de Mugabe
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Marco Longari/AFPAnteriorPróxima













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Editoria de Arte/Folhapress

Raio-x Zimbábue


REVOLUÇÕES

A proximidade entre a China e Mugabe foi o que restou de uma era na qual a China bancava movimentos revolucionários em muitos países em desenvolvimento, no tempo de Mao Tsé-Tung.

Muitos veteranos da guerra de libertação do Zimbábue, entre os quais Emmerson Mnangagwa, vice-presidente deposto que é o mais provável substituto de Mugabe, foram treinados na China.

Mas já no momento em que Xi trocava aquele longo aperto de mãos com Mugabe no aeroporto de Harare, em dezembro de 2015, Pequim não se mostrava assim tão amistosa, nos bastidores.

Diante de uma crise econômica renovada, depois de um breve período de estabilidade, e desprovido de acesso aos mercados financeiros internacionais, o ditador pediu apoio a Xi Jinping, de acordo com diplomatas internacionais.

O dirigente chinês recusou, dizendo ao envelhecido líder zimbabuano que ele precisava criar um plano de sucessão confiável e restabelecer a conexão entre seu país e o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI).

Foi só depois daquela reunião decepcionante, disseram diplomatas, que Harare começou discussões com o objetivo de iniciar um programa com o FMI e pagar os atrasos de sua dívida externa.

O plano terminou fracassando. E se havia uma tentativa de organizar uma sucessão ordeira, ela foi interrompida rudemente por Grace Mugabe, mais de 40 anos mais nova que o marido, que expurgou potenciais candidatos em uma campanha que fez recordar a Camarilha dos Quadro, liderada pela mulher de Mao.

A aparente disposição da China de apostar em um novo cavalo, Mnangagwa, cuja deposição como vice-presidente deflagrou a ação militar, representa um contraste com crises anteriores na África, nas quais a China se manteve aferrada a um ditador amigo por muito mais tempo do que deveria.

A decisão de ficar com Muammar Gaddafi, o ditador líbio deposto e executado, até o amargo fim custou à China bilhões de dólares em contratos estatais de petróleo perdidos, já que as novas autoridades da Líbia cancelaram todos os contratos vigentes como punição aos chineses.

Mesmo que a China não tenha desempenhado papel tão ativo por trás das cenas, a tomada de poder pelos militares zimbabuanos representa um teste crucial.

Desde os anos 50, Pequim respeita os "cinco princípios de coexistência pacífica", entre os quais o de não intervenção em outros países. Agora que seu papel internacional está crescendo, as autoridades chinesas vêm descobrindo que é difícil evitar envolvimento.

A China é o maior investidor no e o maior parceiro comercial do Zimbábue, e tem elos estreitos com muitos membros da elite política do país.

"A grande diferença é que hoje a China tem muito mais em jogo quando surge instabilidade política e econômica em um país em desenvolvimento", disse Andrew Scobell, da Rand Corporation. "A China vem encontrando muito mais dificuldade para colocar em prática aquilo que Pequim sempre pregou ao longo dos anos".

CAMPO DE PROVAS

O Zimbábue pode ser um caso incomum, ele disse, já que a presença dos Estados Unidos e do Reino Unido no país é pequena por conta das sanções. Mas a África se tornou o campo de provas para novas políticas internacionais chinesas, agora que o país começa a abandonar sua posição de não interferência.

Pequim abriu sua primeira base militar no exterior em 2016, no Djibuti, e enviou suas primeiras unidades de combate para uma missão militar no exterior em 2015, contribuindo para as forças de paz da ONU no Sudão do Sul e em outros países africanos.

"A Líbia fez com que as autoridades de política externa e os pensadores chineses concentrassem suas atenções, e aguçou o debate sobre os limites da não interferência", afirmou o International Crisis Group em relatório este ano.

No Sudão e no Sudão do Sul, onde a China tem interesses petroleiros, Pequim assumiu um papel mais ativo, intermediando contatos diplomáticos entre os governos e grupos oposicionistas e criando elos com a sociedade civil.

O grau de envolvimento da China no Sudão do Sul seria impensável alguns anos atrás, afirma o relatório do International Crisis Group.

A situação do Zimbábue pode representar novo sinal de pragmatismo. "Se a China quer evitar que seus interesses sejam prejudicados, se ajustará ao fluxo de mudanças políticas", disse Patey.

Outros ditadores africanos que há muito contam com apoio da China, como Omar al-Bashir, do Sudão, devem estar atentos. "Será que os adversários deles conseguirão convencer a China a fingir que não vê enquanto eles são derrubados?"

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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DITADORES AFRICANOS
Veja os principais líderes já depostos no continente
1º.set.2009 - Xinhua/Imago/Fotoarena

O ex-ditador da Líbia, Muammar Gaddafi, assiste a desfile militar em Trípoli, em 2009


Muammar Gaddafi - Líbia (1969-2011)
Governou a Líbia por 42 anos, após um sangrento golpe militar levá-lo ao poder em 1969. Implantou uma ditadura de ares socialistas e matou milhares de opositores. Foi assassinado por rebeldes em 2011, em meio à Primavera Árabe
Tarek el Gabbas - 26.abr.2014/Associated Press

O ex-ditador egípcio Hosni Mubarak em julgamento sobre sua ação ao reprimir manifestações no Cairo


Hosni Mubarak - Egito (1981-2011)
Era vice do presidente Anwar Sadat, assassinado em 1981. Assumiu o poder e implementou uma ditadura militar marcada pela corrupção e pela repressão aos opositores. Foi forçado a renunciar em 2011, em meio aos protestos da Primavera Árabe que tomaram o Cairo
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Idi Amin - Uganda (1971-1979)
Assumiu após um golpe militar e liderou a mais sangrenta ditadura do continente. Estima-se que os mortos por seu regime cheguem a 500 mil. Fugiu do país durante a guerra com a Tanzânia, buscou refúgio na Líbia e depois na Arábia Saudita, onde morreu em 2003
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