A culpa não é minha Morando em Washington, Eduardo Paes viajou ao Rio para tentar salvar um PMDB
A culpa não é minha
Morando em Washington, Eduardo Paes viajou ao Rio para tentar salvar um PMDB bombardeado pela Lava Jato – seu principal articulador foi Jorge Picciani
POR Bruno Filippo
14 de novembro de 2017 16:22
A operação desta manhã reforçou a preocupação de caciques do partido – eles já sentiam a necessidade de um plano para estancar a sangria que a imagem da legenda vem sofrendo por causa da Lava Jato. Um a um, nomes fortes da sigla no estado vão sendo envolvidos em suspeitas ou caindo em escândalos de corrupção, especialmente depois da prisão do ex-governador Sérgio Cabral. Com medo de que a legenda seja esvaziada e chegue anêmica nas eleições, o ex-prefeito do Rio Eduardo Paes tomou a dianteira para tentar salvar seu grupo político e sua própria viabilidade eleitoral para o ano que vem – Paes quer ser governador.
No dia 24 de setembro, Paes foi à Barra da Tijuca visitar Jorge Picciani, que também é presidente do PMDB estadual. Picciani ainda convalescia, em casa, de uma cirurgia na bexiga e na próstata, por causa de um câncer, e em dez dias reassumiria seu cargo na Assembleia. Durante o encontro, estiveram em pauta o futuro do partido e o risco de perder o comando do estado do Rio em um cenário de crise econômica, aumento da violência urbana, falência do modelo das UPPs e o envolvimento de seus principais caciques em denúncias de corrupção, incluindo um ex-governador.
Picciani e o ex-prefeito delinearam a estratégia pública de defesa da sigla e de suas próprias carreiras políticas: dizer que os problemas do Rio são causados por fatores externos e desvinculá-los dos casos de corrupção que corroem seu partido. O discurso está amparado num tripé: a queda do preço do barril do petróleo, a crise econômica nacional e a Lei Kandir.
O preço do barril, no auge da crise, diminuiu de 120 para 30 dólares. Como a base da economia fluminense é sustentada pelo petróleo, houve significativa queda de receita dos royalties. Ao que se soma a Lei Kandir, pela qual a arrecadação do ICMS sobre o petróleo abastece os cofres do estado ao qual essa matéria-prima se destina, e não de onde é extraída. Referências à má situação da Petrobras, estatal que investe forte no estado, também poderão ser feitas durante esse discurso, porém com cautela, já que isso toca nos casos de corrupção. “Teremos de ser muito firmes na explicação desses assuntos. O eleitor não pode achar que o Rio está em crise por causa do Sérgio Cabral”, disse-lhe Picciani. Na ocasião, o presidente da Alerj afirmou acreditar que, até o início da campanha eleitoral, o momento mais agudo da crise terá passado, devido ao Regime de Recuperação Fiscal, acordado com o governo federal.
Paes afirmou que, em breve, voltará em definitivo para o Rio. E garantiu, dissolvendo boatos que circulavam há semanas, que não deixará o PMDB. No dia anterior, ele não usou tom tão definitivo quando esteve em um apartamento no Flamengo, na Zona Sul da cidade.
Na manhã de 23 de setembro, antes do encontro com Picciani, Paes foi até a casa da deputada federal Cristiane Brasil, do PTB. Tão logo ele entrou na sala, ela sacou o celular, fez uma foto e postou nas redes sociais: “Olha quem veio me visitar? Eduardo Paes! Nosso próximo governador!” Junto com a imagem, um emoji e a indicação de estar “sentindo-se abençoada”. A deputada apagou a foto, talvez temendo reações negativas, mas os efeitos do encontro permaneceram.
Ainda que esteja, por ora, relativamente a salvo da Lava Jato, Paes sabe que pode entrar na mira dos investigadores por conta da delação de Renato Pereira, marqueteiro que trabalhou para o partido e denunciou esquemas de caixa dois nas campanhas. No início de novembro, vazou o teor da delação premiada de Pereira. Ele acusou Paes de embolsar mais de 10 milhões de reais. O ex-prefeito aparece ainda em outras delações: três executivos da Odebrecht disseram que ele recebeu 16 milhões de propina em obras para a Olimpíada de 2016. O ex-prefeito nega as acusações. No início de agosto, o secretário de Obras de sua gestão, Alexandre Pinto, foi preso na Operação Rio 40 graus – um desdobramento da Lava Jato –, acusado de receber propina pela construção de obras públicas.
Paes não acredita que um eventual indiciamento barre seus projetos políticos para concorrer ao governo do estado. “Vou ser candidato. Mesmo que minha família não queira, mas é minha cachaça, está no meu sangue. Não consigo me separar da política”, disse ele à deputada. O PTB é sua carta na manga caso as pesquisas apontem seu atual partido como problema, e não como solução.
Os trabalhistas – cujo presidente nacional é o ex-deputado federal Roberto Jefferson, pivô do escândalo do mensalão em 2005 – já serviram de legenda de aluguel a outros caciques da política carioca. Para a eleição municipal de 2000, por exemplo, Cesar Maia se desfiliou do PFL (atual DEM) no ano anterior porque rompera com o então prefeito Luiz Paulo Conde, seu sucessor e ex-secretário de Urbanismo, que decidira concorrer à reeleição. Disputou a Prefeitura contra seu afilhado político, e o venceu. Logo depois, retornou ao PFL.
Paes mudou-se para os Estados Unidos logo que deixou a Prefeitura, em janeiro, e passou a trabalhar para o Banco Interamericano de Desenvolvimento. Tornou-se também vice-presidente da BYD, fábrica chinesa de caminhões e carros elétricos. Conversei com Eduardo Paes exatamente no dia em que ele se encontrou com Cristiane Brasil. Alegou estar impedido, por contrato, de fazer comentários sobre política. E me garantiu não estar pensando no assunto. “Tanto o meu contrato com o BID quanto com a BYD me impedem de dar entrevistas sobre temas políticos e eleitorais. Aliás, nesse momento estou me dedicando a meu trabalho aqui e não tratando nada de política. Acho que você sabe que gosto de falar. Mas tenho que garantir meu sustento”, disse, e terminou a conversa com um pedido bem-humorado: “Não me trate mal nesta matéria, não.”
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