Goiânia, 2017: precisamos falar sobre bullying


Goiânia, 2017: precisamos falar sobre bullying
Nenhuma autoridade escolar pode resolver o problema com a simples emissão de advertências disciplinares
Por Maicon Tenfen
access_time23 out 2017, 08h00more_horiz


Um tiroteio na manhã da última sexta-feira (20) no Colégio Goyases, no Conjunto Riviera, em Goiânia, deixou dois mortos e mais quatro feridos. (MARCOS SOUZA/VEJA.com)

No desfecho de O Ateneu, o clássico de Raul Pompéia, um estudante chamado Américo toca fogo no colégio que dá título ao romance. As chamas se espalham com rapidez, tudo vem abaixo, sobram apenas os escombros e as cinzas do educandário. Qual o motivo da rebeldia? Sérgio, o narrador da história, não chega a uma conclusão muito segura, já que a atitude é incompreensível para quem não partilha dos devaneios e da loucura de Américo.

No entanto, há um clima de catarse no andamento da cena. É como se o incêndio pudesse purificar a maldade que imperava entre os muros do internato. “Vais encontrar o mundo”, disse o pai de Sérgio no primeiro dia de aula. “Coragem para a luta”. Daí pra frente, com efeito, o personagem se vê numa selva cuja razão de ser dos estudantes “mais adaptados” é humilhar os novatos com o uso do deboche e da agressão.
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Por que Sérgio não denunciava o bullying para os professores? Simplesmente porque isso não está previsto nas regras implícitas que norteiam a conduta de qualquer agrupamento estudantil, seja em 1888 ou em 2017. Sérgio estava sozinho, assim como Américo e os demais. Precisava se adaptar às severas leis de um pátio escolar. Conforme a intuição do seu pai, toda escola é a transfiguração do mundo, não pelos currículos que oferece, mas por se mostrar um palco propício à violência.

“Tornei-me um bicho ruim”, confessa Sérgio em certa altura, e não se trata de simples retórica. Criado à imagem e semelhança dos carrascos que o maltratavam, cedo ou tarde encontraria uma forma de se vingar. É a “lei”: ou você se adapta ao sistema, ou perece sob as botas da tirania. Mas a desforra de Sérgio se deu apenas em pensamento. Américo, por sua vez, encontrou uma caixa de fósforos. O que aconteceria se tivesse encontrado uma pistola?

A resposta está na tragédia de Goiânia, ainda que os pais de alguns alunos descartem o bullying como explicação.

A prática constante da violência psicológica parece ser capaz de colocar os adolescentes num estado mental de irrealidade. Agressores e agredidos passam a viver num universo em que as regras sociais e os parâmetros do bom senso não fazem mais sentido. Instalado esse cenário, basta um passo — ou um disparo acidental — para que uma vingança sanguinária se concretize.

Com um compreensível olhar de perplexidade, a coordenadora que conseguiu conter o atirador disse em entrevista que nunca foi procurada por nenhum dos envolvidos para resolver problemas de bullying. É um silêncio que Sérgio conhecia bem. As vítimas costumam internalizar a ideia de que qualquer tentativa de denúncia seria um desastre. Calam-se e sonham com o próprio sumiço, ou com a morte, ou ainda com uma desforra desproporcional.

A solução de Américo é tentadora para quem vive o drama da humilhação cotidiana.

O bullying, por isso, não é um problema que se possa resolver com a emissão de advertências na secretaria do colégio. Ele também acontece por olhares e meias palavras. Só uma mudança de comportamento que atinja uma sociedade inteira poderia surtir os efeitos desejados. É possível? Se aprendemos a deplorar a violência que ocorre no outro lado do mundo, deveria ser fácil não praticá-la nos pátios das nossas escolas.

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