Soltura de homem que ejaculou em mulher no ônibus divide juristas Especialistas ouvidos por VEJA se dividem entre aqueles que acham que juiz seguiu o que diz a legislação e quem enxerga uma interpretação equivocada da lei


Soltura de homem que ejaculou em mulher no ônibus divide juristas
Especialistas ouvidos por VEJA se dividem entre aqueles que acham que juiz seguiu o que diz a legislação e quem enxerga uma interpretação equivocada da lei
Por Edoardo Ghirotto
access_time1 set 2017, 19h34more_horiz


Diego Ferreira de Novaes, que ejaculou sobre o pescoço de uma mulher dentro de ônibus na Avenida Paulista, em São Paulo (Reprodução/TV Globo)

A decisão do juiz José Eugenio do Amaral Souza Neto, do Foro Central Criminal da Barra Funda, de libertar o ajudante-geral Diego Ferreira de Novais, de 27 anos, preso na terça-feira, em flagrante, após se masturbar e ejacular em uma passageira dentro de um ônibus na Avenida Paulista, na região central de São Paulo, dividiu opiniões no meio jurídico.

Souza Neto decretou que houvesse o relaxamento do flagrante por entender que não houve estupro, como a Polícia Civil havia registrado a ocorrência, mas “importunação ofensiva ao pudor”, que é classificada como uma contravenção penal – veja abaixo a argumentação completa do magistrado para mandar soltar o suspeito e o que dizem cinco juristas ouvidos por VEJA.
A íntegra da decisão do juiz



Na espécie, entendo que a conduta pela qual o indiciado foi preso melhor se amolda à contravenção penal do art. 61, LCP [Lei das Contravenções Penais] do que ao crime de estupro (art. 213, Código Penal). Explico. O crime de estupro tem como núcleo tipico constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. Na espécie, entendo que não houve o constrangimento, tampouco violência ou grave ameaça, pois a vitima estava sentada em um banco do ônibus, quando foi surpreendida pela ejaculação do indiciado. O ato praticado pelo indiciado é bastante grave, já que se masturbou e ejaculou em um ônibus cheio, em cima de uma passageira, que ficou, logicamente, bastante nervosa e traumatizada. Ademais, pelo exame da folha de antecedentes do indiciado, verifica-se que tem histórico desse tipo de comportamento, necessitando de tratamento psiquiátrico e psicológico para evitar a reiteração de condutas como esta, que violam gravemente a dignidade sexual das mulheres, mas que, penalmente, configuram apenas contravenção penal. Como essa contravenção é apenas somente com multa, impossível a homologação do flagrante. Ante o exposto, relaxo a prisão em flagrante. Expeça-se alvará de soltura.



Gustavo Badaró, professor associado de direito processual penal da USP

“Há uma diferença semântica. A mulher se sente constrangida e revoltada com o que aconteceu, mas, para caracterizar o estupro, a lei não trata do constrangimento no sentido de causar vergonha. Ela aborda o ato de forçar indevidamente alguém a configurar o ato libidinoso. O relaxamento do flagrante foi correto porque não houve constrangimento prévio para conseguir o ato libidinoso. Não é possível decretar a prisão preventiva porque a lei não permite que isso seja feito para crimes cuja pena é inferior a quatro anos.

É preciso que a legislação penal, no caso da tipificação, acompanhe a evolução social. Esse é um ato extremamente grave, causa um constrangimento no sentido de revolta. Talvez seja preciso pensar em condutas que são reais, que acontecem hoje, mas que não eram praticadas em 1940, quando o Código Penal foi feito. A crítica feita ao juiz é injusta. A crítica deveria ser ao legislador, que tem se omitido na hora de tipificar a conduta. O juiz não pode criar crimes da cabeça dele ou fazer analogias que levem o cidadão a ser punido por crimes que não existem. A revolta social não deve ser contra o juiz, mas contra a insuficiência da legislação brasileira.”




O juiz não pode criar crimes da cabeça dele ou fazer analogias que levem o cidadão a ser punido por crimes que não existem. A revolta social não deve ser contra o juiz, mas contra a insuficiência da legislação brasileira.”




Luiza Nagib Eluf, advogada criminal e procuradora aposentada da Justiça de São Paulo

“A discussão é de que não houve violência. Só sendo muito despreparado para dizer que essa conduta não teve violência. É preciso ter a clareza de que a violência se manifesta de várias formas, não existe uma única forma de constrangimento. Alguns juristas encaram o estupro como aquela velha modalidade em que a moça passa em uma rua escura e é atacada por alguém armado. Você pode violentar alguém quando ejacula no seu rosto, isso já é um constrangimento brutal.

Muito me espanta que existam juristas que não tenham percebido o constrangimento que essa conduta representou. Essas pessoas estão cegas. A decisão do juiz de liberar o acusado foi um erro grosseiro. Fiquei muito espantada com a concordância do promotor, que tem a função primordial de defender a sociedade dos bandidos e dos maníacos sexuais. Pena por estupro é prisão preventiva. É preciso haver uma atualização mental e conceitual dos aplicadores do direito, que erraram nesse caso.”




Muito me espanta que existam juristas que não tenham percebido o constrangimento que essa conduta representou. Essas pessoas estão cegas. A decisão do juiz de liberar o acusado foi um erro grosseiro.



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Rogério Cury, especialista em direito penal e sócio do escritório Cury & Cury Advogados Associados

“Se o juiz entendeu que, em tese, houve contravenção penal, então ela só possui pena de multa, não possui nenhuma pena privativa de liberdade nem sequer restritiva de direito. É inequívoco que o ato é completamente ilegal, é uma infração penal, mas não um crime de estupro. Deveria haver uma revisão na legislação para que esse tipo de conduta seja punida com mais severidade.

Os juízes devem aplicar a lei rigorosamente, sob a pena de cometer abuso de autoridade. Não há outra escolha diferente da aplicação da lei em vigor. É um ato imoral, mas punido de forma branda. Seria desproporcional. A população deve voltar os olhos para o legislador. É um caso interessante diante da legislação, porque a conduta é grave devido ao incômodo que causa à vítima, mas a resposta legislativa não é proporcional.”




A população deve voltar os olhos para o legislador. É um caso interessante diante da legislação, porque a conduta é grave devido ao incômodo que causa à vítima, mas a resposta legislativa não é proporcional.




Silvia Pimentel, professora da PUC-SP e integrante do Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher da ONU

“Os colegas têm grande dificuldade de perceber que estão equivocados quando não conseguem enxergar a violência desse ato. É uma violência moral, psicológica e inaceitável. Entendo que é um conceito ultrapassado se ficarmos só na violência física, de agarrar uma pessoa ou de usar a força física. As interpretações que consideram essa ação como uma contravenção estão equivocadas. Não estão levando em consideração a perspectiva da mulher, sobre o que significa uma ejaculação de um desconhecido no seu corpo.

Participei de um encontro de mulheres pela manhã e disse que, mesmo sem a violência física, havia a violência moral, simbólica e psicológica no ato. Uma pessoa que estava na plateia se levantou e discordou, questionando como não seria uma violência física o fato de ter em seu pescoço o esperma masculino, sem ter consentido. Não sou uma penalista, mas, no meu entendimento, existiu uma banalização desse ato [com a decisão do juiz].”




As interpretações que consideram essa ação como uma contravenção estão equivocadas. Não estão levando em consideração a perspectiva da mulher, sobre o que significa uma ejaculação de um desconhecido no seu corpo.




Sylvia Urquiza, advogada criminalista e sócia do Urquiza, Pimentel e Fonti Advogados

“O caso da ejaculação não teve grave ameaça ou violência expressa, portanto, não se enquadraria como estupro, mas seria uma violência sexual mediante fraude, com pena de dois a seis anos de prisão. É uma dificuldade lidar com as autoridades e fazê-las entender que o bem jurídico tutelado é a liberdade e a vontade da vítima. Os atos libidinosos só podem ser praticados por livre e expressa manifestação da vontade. Não há livre vontade quando pessoas se aproveitam do elemento surpresa ou de um aglomerado de pessoas.

A semântica atrapalha porque faz com que a sociedade não consiga distinguir as coisas. É grave não termos uma legislação que especifica esse tipo de prática porque abre margem para as autoridades imaginarem que não há crime quando não há ameaça ou violência. Por isso, a revolta deve ser dirigida às autoridades de um modo geral. Elas não têm a desculpa de não conhecer a legislação. Apesar de ensejar diferentes interpretações e por mais ampla e aberta que seja a tipologia, o Código Penal condena a violência sexual e protege a liberdade sexual dos indivíduos.”




Os atos libidinosos só podem ser praticados por livre e expressa manifestação da vontade. Não há livre vontade quando pessoas se aproveitam do elemento surpresa ou de um aglomerado de pessoas.

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