Garotas precoces Corpo delineado antes do tempo, roupas insinuantes e valores dos adultos. As meninas estão virando mulheres cada vez mais rápido e isso preocupa os especialistas
Garotas precoces
Corpo delineado antes do tempo, roupas insinuantes e valores dos adultos. As meninas estão virando mulheres cada vez mais rápido e isso preocupa os especialistas
Nada será como antes. As meninas estão crescendo mais rápido. Já têm curvas, comportamentos e hábitos de consumo de adultas que movimentam no mundo uma indústria de US$ 15 bilhões (R$ 33 bilhões) anuais. Por volta dos dez anos, essas garotas começam a mudar o jeito de vestir, falar e agir. Querem usar roupas mais insinuantes e, para desespero dos pais, deixar de ser BV ou BVL (na gíria teen, boca virgem ou boca virgem de língua). Porém, o que mais preocupa os especialistas é que essa aceleração no comportamento se reflete no corpo com intensidade cada vez maior. “Atualmente, os seios crescem mais cedo e a menstruação chega, em média, aos 12 anos. Significa que ela pode ocorrer entre dez e 14 anos”, explica o médico especialista em adolescentes Maurício Souza Lima, do Hospital das Clínicas de São Paulo.
No mundo, os cientistas se esforçam para compreender o fenômeno. Desde o ano passado, um time de especialistas de 12 países, financiado pela União Européia, dedica-se ao estudo dos fatores que precipitam o fim da infância e sua relação com a alimentação. Nos países desenvolvidos, nota-se que o aumento de casos de crianças que entram na puberdade bem antes do tempo médio – com surgimento de pêlos pubianos e seios já a partir dos cinco ou seis anos – está ligado ao crescimento da obesidade infantil. “Esses são casos especiais, que precisam de tratamento”, diz a ginecologista Rosana Simões, da Universidade Federal de São Paulo. O cientista brasileiro Júlio Licínio, da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, explica a ISTOÉ uma das principais hipóteses que ligam precocidade e alimentação. “Mais numerosas nos obesos, as células de gordura produzem o hormônio leptina. No laboratório, animais que tomaram leptina tiveram puberdade e amadurecimento dos órgãos sexuais antes do tempo. Pode ser o que ocorre com essas crianças”, diz.
A sociedade tem grande participação na mudança. “As meninas estão submetidas a uma forte pressão social que as empurra para a erotização precoce. Desde pequenas, estão expostas a outdoors de apelos sensuais, a programas de tevê e capas de revistas que apontam para o erotismo. Elas percebem o valor que a sociedade dá a isso”, diz a educadora e psicóloga Rosely Sayão. No Brasil, a televisão contribui muito. Nossos pequenos ficam quatro horas e 51 minutos por dia em frente da tevê, um recorde mundial. “Além disso, 80% da programação a que assistem é para os adultos”, afirma a psicanalista de infância e adolescência Ana Olmos.
Esse ambiente envolve meninos e meninas de tal modo que muitos trocam a infância pela adolescência antes mesmo de passar pela puberdade, a fase das transformações provocadas pelos hormônios. Diante desse contexto, qual é o papel dos pais? “Eles devem deixar claro que não pactuam com determinadas vestimentas ou estilo de vida. Mesmo que isso torne a filha diferente da maioria das colegas”, afirma Rosely.
Agir desse modo vai contra as expectativas teens, mas surte efeito. Apesar dos protestos da filha Beatriz, 11 anos, sua mãe, Debora Belintani, deu-lhe um celular que apenas recebe ligações, monitora as conversas na internet e não a deixa pintar os olhos para ir à escola. “Dou liberdade controlada para que ela se sinta segura para crescer”, explica Debora, que conversa muito com as mães de amigas mais próximas da filha. Dessa lista faz parte a psicanalista Maria Helena Fernandes, mãe de Elisa, dez anos. “Cabe aos pais aceitar a diferença de geração, manter-se sempre próximos dos filhos e não ceder na tarefa de dizer o que eles podem fazer”, diz Maria Helena. Muitas vezes, proibir a filha de beijar na boca antes dos dez anos, por exemplo, pode aliviar a cobrança sobre as crianças. Segundo a psiquiatra americana Susan Linn, autora do livro Crianças do consumo, a infância roubada (Editora Instituto Alana, 322 págs.), lançado esta semana no Brasil, uma em cada três crianças americanas entre dez e 11 anos acredita que a pressão para que façam sexo antes de estarem preparadas é um grande problema.
Se a cabecinha dessas meninas ainda não está pronta para absorver tantas mudanças, o mesmo não se pode dizer do mercado. As indústrias da moda e da beleza, ávidas para lucrar com os anseios gerados pela apropriação precoce dos valores adultos, lançam sem parar novidades para a garotada. De maquiagem a jóias, roupas de grife e bufês infantis com serviço de cabeleireiro, já é possível encontrar de tudo na fatia de mercado chamada de tween pelos publicitários (fusão de teen com between – entre, em inglês), relativa aos pré-adolescentes. Só a moda infanto-juvenil brasileira movimenta R$ 10 bilhões ao ano, o que corresponde a um terço de toda a roupa consumida no País. E são exatamente as garotas que dominam a cena. “Cerca de 60% da moda nacional é dirigida ao público feminino. Desse total, outros 60% são consumidos por garotas entre dez e 18 anos”, diz Sara Kalili, diretora do Teen Fashion, semana jovem de moda cuja terceira edição começa no dia 29. Faz sentido. “Os cuidados com as roupas e o visual fazem parte da auto-afirmação do adolescente. Eles não querem roupas de crianças e são novos demais para se vestir como adultos. Precisam da sua própria moda”, diz a empresária Christiane Rocco, da grife Spezzato Teen, uma das primeiras a investir nesse público.
A indústria da beleza também lucra com a vaidade precoce das meninas brasileiras. As vendas de cremes e loções para crianças e adolescentes tiveram um crescimento de 204,6% em seis anos. O feito ajuda a entender por que as consumidoras mirins – pasmem! – já estão quase tão acostumadas a usar batom quanto as mulheres adultas, como mostra um levantamento do instituto Ipsos Brasil. Entre janeiro e dezembro de 2005, a instituição ouviu 19,7 mil mulheres para saber mais sobre seus hábitos de consumo. Nada menos que 69% das crianças de dez a 12 anos afirmaram usar batom com freqüência. Entre as mulheres acima de 13 anos, esse número não passou dos 68%. Um bom motivo para as mamães esconderem o estojo de maquiagem.
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