A nova xerife do Brasil Acusadora com desassombro e coragem, Raquel Dodge assume a PGR com menos espuma, mais trabalho e sem a intenção de contemporizar com malfeitos de quem quer



ROMÁRISOUZA

A nova xerife do Brasil
Acusadora com desassombro e coragem, Raquel Dodge assume a PGR com menos espuma, mais trabalho e sem a intenção de contemporizar com malfeitos de quem quer que seja. O primeiro alvo será a delação da JBS


SEM MAROLA A nova procuradora-geral da República, Raquel Dodge, será mais objetiva que seu antecessor (Crédito: Zanone Fraissat/Folhapress)


Ilimar Franco15.09.17 - 18h00



A nova Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, não tem medo de cara feia nem do perigo. Durante seus trinta anos de carreira ela mostrou coragem e que não tem por hábito contemporizar. Ela assume a PGR na segunda-feira 18, e seus auxiliares garantem que uma de suas primeiras iniciativas será realizar um rigoroso pente fino na delação de Joesley Batista, da JBS. Fará esta revisão para limpar o terreno e corrigir os equívocos que tanta polêmica tem provocado nas últimas semanas. Segundo aliados, Dodge se diferencia do antecessor por se importar menos com a espuma do que com o conteúdo dos processos.
Enganam-se, no entanto, aqueles que imaginam que ela passará a mão na cabeça dos envolvidos na Lava Jato ou facilitará a blindagem de quem quer que seja. Juristas e advogados que a conheceram, ao longo da carreira, alertam que ninguém deve se iludir com a nova procuradora. A visita que fez à noite, no Palácio do Jaburu, ao presidente Michel Temer, passou uma imagem errada de como ela será no exercício do cargo e diante das tarefas jurídicas e criminais que terá pela frente.

Uma procuradora implacável

O ministro Marco Aurélio Mello, para quem Dodge trabalhou durante muitos anos quando este era ministro do Trabalho, avisa que “as pessoas têm o direito de pensar o que quiserem, mas ela atua como acusadora com desassombro e coragem”. O ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, ao mesmo tempo em que declara não integrar sua patota, afirma que: “Não é controlável. E não dará mole ao Executivo Federal”. E diz que Dodge não faz negócios obscuros à noite e muito menos aceitaria abraço de afogados.

Se alguém duvida do que ela seja capaz, seus aliados citam também, como exemplo, a Operação Caixa de Pandora (2009). Ela custou o mandato de um governador, José Roberto Arruda, do Distrito Federal, que teve sua prisão decretada e ordem executada por uma força-tarefa sob seu comando.

O caso estava nas mãos do STJ, onde ela era subprocuradora e assumiu a investigação. Foi nessa condição que ela reivindicou para o então procurador geral, Roberto Gurgel, a criação de uma força-tarefa. Esta teria como missão investigar o governador da época, o vice Paulo Octávio, secretários de estados e servidores . No final do processo, Arruda terminou perdendo seu mandato. Está com seus direitos políticos suspensos desde então.

A escalação do time de Dodge indica que ela não irá transigir com desvios de qualquer natureza

Dodge também teve atuação num caso de repercussão nacional: o que envolvia um esquadrão da morte, tráfico de drogas e corrupção. Ela foi voluntária para integrar a força-tarefa, criada pelo então procurador-geral, Geraldo Brindeiro, e ir a Rio Branco, no Acre, ao lado de outros dois procuradores (José Roberto Santoro e Marcelo Serra Azul), a fim de investigar a atuação criminosa do deputado Hildebrando Pascoal, o “Deputado Motoserra”. A organização criminosa tinha tentáculos no Judiciário local, na polícia militar e no governo do Acre. A investigação, da qual Dodge participou, terminou com a prisão de 80 pessoas que, pela quantidade, foram transportados num Buffalo da FAB para Brasília.

A equipe convocada para trabalhar no seu mandato também revela como será sua conduta. Para o Grupo de Trabalho da Lava Jato escalou Alexandre Espinosa e José Alfredo de Paula Silva, que trazem no currículo terem participado da equipe do ex-procurador Antonio Fernando de Souza, que denunciou os integrantes do governo Lula envolvidos no escândalo do mensalão. Também é deste time sua secretária de Função Penal, Raquel Branquinho. Esta, além disso, é conhecida pelo rigor com que cobra seus colegas.

Entre os políticos a expectativa é a de que ela não vire refém da jovem guarda do Ministério Público, como Janot. Acreditam que ela será capaz de conter excessos, como o vazamento de informações que não foram processadas e verificadas. Os que a conhecem avaliam que ela vetará a divulgação de fatos de investigações ainda não encerradas. Um passo à frente, sem dúvida.

Correção de rumos
As dúvidas que pairam sobre a nova gestão:

JBS e Marcelo Miller
O que será feito com as delações dos executivos da JBS? Benefícios serão revistos, o acordo será renegociado ou rompido? Joesley Batista e Ricardo Saud serão denunciados pelas omissões e mentiras nos depoimentos das colaborações? O ex-procurador Marcelo Miller será alvo de novos procedimentos?

Temer
Janot ofereceu denúncia contra o presidente Michel Temer por corrupção passiva, já rejeitada pela Câmara. No apagar das luzes de seu mandato, denunciou o presidente também por obstrução de Justiça e organização criminosa, com base em delações, como a de Funaro. Há possibilidade de uma terceira denúncia, que vinha sendo prometida por Janot, sair do papel?

Aécio Neves
O caso de Aécio Neves decorrente das delações da JBS ainda não avançou o suficiente. Janot insistiu na prisão do senador, sempre rejeitada pelo STF. O que Raquel Dodge fará com relação ao tucano? Insistirá na prisão? Vai oferecer denúncia? Revisará o caso por se tratar de gravações feitas pelos “fanfarrões” da JBS?

Revisão de delações

Nos bastidores, é forte a informação de que Raquel Dodge vai revisar alguns acordos de colaboração firmados por Janot e considerados fracos, como os de Sérgio Machado. São colaborações com poucas provas. No caso de Machado, muitos procedimentos foram arquivados e a própria Polícia Federal reconheceu que a delação careceu de substância. Dodge vai fazer uma espécie de “recall” em acordos negociados por seu antecessor? Quais serão os critérios adotados?

Saída pelos fundosDivulgação

A despedida do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não poderia ter sido mais melancólica. Na última semana, ele e o advogado Pierpaolo Bottini, que defende o empresário Joesley Batista, um dos sócios da J&F, foram flagrados nos fundos de um bar de Brasília. A foto tirada por um freqüentador do estabelecimento, localizado próximo à residência de Janot, foi publicada pelo site O Antagonista. O cliente do bar contou que o procurador-geral e o advogado conversaram por mais de 20 minutos. Para não atrair atenção, ficaram em uma mesa ao lado de uma pilha de caixas de cerveja. De óculos escuros, Janot estava fantasiado de Rodrigo Janot. Mais inspetor Clouseau impossível FARIA

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