Edson Fachin: ele ergueu o véu do sigilo

Edson Fachin: ele ergueu o véu do sigilo

Ao pedir a abertura de 76 inquéritos, e dar publicidade a 74 deles, o ministro do Supremo permite ao Brasil conhecer a realidade da política, por pior que ela seja

FLÁVIA TAVARES
13/04/2017 - 18h51 - Atualizado 13/04/2017 18h51
Numa sexta-feira de agosto do ano passado, pouco mais de dois meses depois de assumir uma vaga como ministro do Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin fez um discurso premonitório em um almoço com advogados em São Paulo. “O presente no Brasil tem sido tão intenso, nós estamos sequestrados de tal modo – e é um sequestro, por assim dizer, legítimo pelo interesse que movimenta pessoas e instituições –, estamos chamados, vocacionados de tal modo pelo presente que muitas vezes acabamos imaginando ou deixando passar a impressão de que o pretérito é dispensável e de que o futuro está muito distante”, disse o ministro. Àquela altura, Fachin não imaginava o cárcere que enfrentaria a partir de fevereiro deste ano. Com a morte do colega Teori Zavascki, em janeiro, Fachin foi sorteado para ser o novo relator da Operação Lava Jato no Supremo. Desde então, tornou-se refém, para manter a metáfora, do maior processo de investigação de corrupção na história do Brasil.
Luiz Edson Fachin,ministro (Foto:  Sérgio Lima/ÉPOCA)
Fachin não é um refém convencional, por óbvio. Como relator, é senhor do andamento do processo na Corte. O que o torna um “sequestrado” pelo presente é a dimensão que o caso que relata toma a cada novo desdobramento. No capítulo desta semana, quiçá o mais estrondoso até aqui, Fachin determinou a abertura de 76 inquéritos contra políticos de todos os escalões, de diversos partidos, atingindo mais duramente os três maiores: PT, PMDB e PSDB. Mais do que isso, atendeu a um pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e suspendeu o sigilo de 74 inquéritos. Numa atitude certamente inspirada pelo que faria o ministro Teori, a quem substituiu, Fachin deu ao Brasil a oportunidade de dissecar os depoimentos dos 77 executivos da Odebrecht que aceitaram fazer delações premiadas. Deu ao Brasil a chance de compreender como os mecanismos engenhosos da corrupção apodreceram a Petrobras e apodrecem a política nacional há décadas. Deu ao Brasil a possibilidade de escapar do cativeiro do presente, estudar com minúcia seu passado e vislumbrar a liberdade no futuro.
É bem verdade que o ministro foi surpreendido pelo desenrolar avassalador do presente. Já eternizada na memória nacional, a “lista de Fachin”, com o nome dos políticos a ser investigados, vazou na tarde da terça-feira, dia 11. Fachin estava em Santa Catarina. Pretendia publicar os autos depois do recesso do Judiciário, em folga pelo feriado da Páscoa. Aguardava também a volta de Janot de uma viagem à Ásia. Mas o presente que sequestra é também o que atropela. O país está sedento por resoluções na Lava Jato – e a imprensa, por informações. A lista de Fachin vazou. Com ela, e até mais importante que ela, foram divulgados os depoimentos dos delatores da Odebrecht – o juiz Sergio Moro suspendeu o sigilo dos vídeos com os depoimentos tendo como base a decisão de Fachin. Marcelo Odebrecht e seus colegas relatam com pormenores assombrosos como a empreiteira se relacionava com agentes públicos que vão de ex-presidentes (Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff) a ministros do Tribunal de Contas da União, passando por Câmara e Senado, por governadores e por ministros do governo Temer e dos governos petistas.
O ministro Teoro,morto em janeiro,e Fachin.Eles têm perfis similares,são discretos e técnicos (Foto: Agência Senado)
Se, ao ser indicado por Dilma para o Supremo, Fachin enfrentou críticas de quem o identificava com o PT e com movimentos sociais como o MST, quando ele assumiu a relatoria da Lava Jato houve um suspiro generalizado de alívio. Primeiro, porque Fachin é extremamente aplicado. No dia em que foi escolhido como relator, Fachin convocou em seu gabinete, no 5o andar do Supremo, o juiz Márcio Schiefler Fontes, que auxiliava Te­ri nos processos da operação. No dia seguinte, Fachin se reuniu com Rodrigo Janot para se inteirar da metodologia dos procuradores na investigação. Em segundo lugar, porque Fachin é discreto. Diferentemente de outros ministros, ele raramente se manifesta publicamente sobre a Lava Jato. Naquele almoço com advogados em agosto, Fachin deu uma declaração muito republicana sobre a operação. “(A Lava Jato) É uma atividade extremamente relevante para o país. Acredito que o Supremo tem, no conjunto de suas atividades, se colocado nessa direção. Quando há eventualmente algum ajuste, alguma correção a ser feita, o Supremo tem feito nos casos concretos. Quando não há, o Supremo tem chancelado as atividades, tem prestigiado os juízes de primeiro grau que atuam nesta e em outras operações conexas”, disse. É tudo o que se quer ouvir.
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A atitude de Fachin certamente foi inspirada pelo que faria o ministro Teori, a quem ele substituiu como relator da Lava Jato
A escolha de Fachin como relator, embora por sorteio, não foi aleatória. O ministro pediu para migrar da Primeira para a Segunda Turma do Supremo naquela manhã – o sorteio seria entre os ministros da Turma a que pertencera Teori. Ao justificar o pedido, Fachin disse que queria honrar o trabalho do colega, cujo perfil era tão parecido com o seu: ambos considerados técnicos, reservados e alheios à pressão externa. Quando seu nome foi selecionado pelo algoritmo que faz a escolha, o ministro divulgou uma nota em que reiterava “seu compromisso de cumprir seu dever com prudência, celeridade, responsabilidade e transparência, com o que pretende, também, homenagear o saudoso amigo e magistrado, o eminente ministro Teori Zavascki”. Essa deferência não foi mera formalidade. Foi uma sinalização de independência e neutralidade, atributos que não colam tão facilmente em alguns ministros cujas posições já foram demasiadamente expostas fora dos autos.
Com menos de dois anos no Supremo, Fachin já deixou claro, em suas decisões, que tende a reafirmar a jurisprudência da Corte. Não é afeito a surpresas e reviravoltas. Também faz questão de relativizar o papel dos ministros do Supremo como julgadores definitivos. “Tenho dito, com todas as vênias, com todo o respeito, que não subscrevo por inteiro a ideia de que a última palavra é a do Supremo Tribunal Federal. O STF define o estado da arte num dado momento e num dado tempo. Mas o titular último acaba remetendo à própria sociedade”, disse, com sua dicção apertada, em agosto. Fachin dissertou, ao longo da palestra de quase 40 minutos, com um linguajar rebuscado e hermético, sobre o que chamou de “fim da invisibilidade do juiz”. Disse que os julgadores não se tornaram mais visíveis apenas pela veiculação de julgamentos na TV Justiça, mas pela importância que assumiram desde a redemocratização. “O fim da invisibilidade do julgador se deve ao exercício da cidadania, à afirmação democrática do nosso Estado e da sociedade, às reivindicações justas e legítimas que reclamam que o julgador não pode nem deve esconder-se atrás de uma blindagem do exercício de suas funções, e que portanto dialogar, expor e expor-se faz parte dessa atividade”, explicou Fachin. Eram, novamente, palavras com ar de presságio. Ao pedir a abertura dos 76 inquéritos e levantar o sigilo de 74 deles, sequestrado pela urgência do presente, Fachin se expôs e expôs. Cumpriu seu papel de julgador.

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