O inimigo do meu inimigo é meu amigo

O inimigo do meu inimigo é meu amigo

Os Estados Unidos concluem, com sucesso, as negociações sobre o programa nuclear do Irã. Ao mesmo tempo, os americanos se afastam de Israel – mudando o panorama no Oriente Médio

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA*
17/04/2015 19h08
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CONVERGÊNCIA O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, e o chanceler iraniano,  Javad Zarif. Os dois inimigos históricos se aproximam  (Foto: Brendan Smialowski/Reuters)
A reeleição de Benjamin Netanyahu como primeiro-ministro de Israel e a conclusão com sucesso de negociações sobre o programa nuclear do Irã podem promover uma das mais dramáticas mudanças geopolíticas da história recente. Os Estados Unidos estão se distanciando em ritmo sem precedentes de Israel, seu mais importante e decisivo aliado no Oriente Médio. Ao mesmo tempo, num compasso inédito, estão se aproximando do Irã, seu maior inimigo ali há 36 anos.
As discordâncias entre EUA e Israel se agravaram devido ao claro desprezo mútuo nutrido pelo presidente Barack Obama e pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Mas elas têm natureza política. Os fundamentos da aliança entre americanos e israelenses têm sido que as duas nações compartilham valores essenciais, como o respeito à democracia. Mas tem crescido na sociedade americana, em especial nos setores liberais, a impressão de que Israel se afasta dos princípios democráticos, devido à maneira como vem tratando seus cidadãos árabes (20% da população do país) e os muçulmanos dos territórios palestinos de Gaza e Cisjordânia.

Essas diferenças vêm se acentuando desde a primeira eleição de Netanyahu, em 1996, e a ascensão dos conservadores na sociedade israelense. Ampliaram-se a partir da vitória de sua aliança de extrema-direita em 2009. Na recente reeleição de Netanyahu, seu comentário, nas horas finais da votação, sobre o que chamou de “conspiração esquerdista” para levar de ônibus “manadas de eleitores árabes” às urnas ajudou a insuflar ainda mais seus críticos nos EUA (o premiê, depois de reeleito, se desculpou pela acusação, mas isso não ajudou a acalmar os ânimos). Em diversas universidades e igrejas americanas, há movimentos fortes de boicote a Israel com o argumento de que os israelenses praticam contra árabes e palestinos um regime de apartheid similar ao da África do Sul pré-Mandela.

Os governos dos dois países também têm uma divergência fundamental de estratégia para a resolução do conflito entre israelenses e palestinos. A pedra de toque da posição americana desde 1967 tem sido a tese dos dois Estados (israelense e palestino). Ainda que de maneira ambígua, contraditória ou protelatória, diferentes administrações israelenses, ao longo dos anos, aceitaram essa tese, com raras exceções. Netanyahu vinha dela se distanciando cada vez mais ostensivamente. Na campanha pela reeleição, ele a rechaçou por completo (embora, também neste caso, depois da vitória, tenha ensaiado um recuo pouco convincente).
 
DIVERGÊNCIA O premiê de Israel, Netanyahu, em visita aos EUA. Os aliados históricos se afastam (Foto: Justin Sullivan/ADP)
As negociações sobre o projeto nuclear do Irã são o mais recente  e grave ponto de discórdia entre EUA e Israel. Obama considera que um possível acordo que impeça o Irã de ter armas nucleares será o principal legado de seu governo na área das relações internacionais. Tem dado a esse esforço prioridade absoluta. Netanyahu afirma que o Irã não respeitará nenhum acordo e que isso representa uma ameaça à sobrevivência de Israel. Obama ficou especialmente irritado com a ida de Netanyahu em 3 de março ao Congresso americano, a convite do Partido Republicano, para discursar contra as negociações sobre o projeto nuclear do Irã. Com os pontos gerais do acordo aprovado na quinta-feira, dia 2, EUA e Irã devem continuar seu lento processo de reaproximação.
Desde a revolução iraniana de 1979, que depôs o xá Reza Pahlevi e colocou no poder o aiatolá Khomeini, EUA e Irã se acostumaram a se tratar como os piores inimigos. Para o regime do Irã, os EUA eram “o grande Satã”. Para o dos EUA, o Irã era a base do “eixo do mal”. No entanto, a dinâmica geopolítica do Oriente Médio tem feito com que inimigos comuns coloquem EUA e Irã do mesmo lado. A base da aproximação entre EUA e Irã é a cooperação militar no combate ao Estado Islâmico, o grupo radical sunita que controla regiões do território do Iraque e da Síria.

O Irã vem apoiando com armas e treinamento milícias e os governos do Iraque e da Síria que combatem o Estado Islâmico. Para os EUA, derrotar o Estado Islâmico e manter o Iraque unido e com um governo que lhe pareça confiável (como o atual) é de suma importância. Por isso, de modo informal, os EUA vêm dando cobertura aérea e informações para as forças xiitas orientadas pelo Irã. Essa cooperação nem tem sido tão disfarçada. Em depoimento ao Senado americano, o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas dos EUA, general Martin E. Dempsey, declarou textualmente: “O envolvimento de milícias xiitas bancadas pelo Irã é um dado positivo”. (Embora tenha ressalvado: “Desde que não exacerbe as tensões sectárias”.)

Por conta dessa colaboração no Iraque, os EUA amenizaram sua oposição ao regime de Hafez-al-Assad na Síria, apoiado pelo Irã. Também limitaram seu apoio ao governo do Iêmen, já quase deposto pela oposição armada xiita que conta com o suporte dos iranianos. A Arábia Saudita assumiu a liderança da luta contra os xiitas no Iêmen. Para Israel, esses desdobramentos são preocupantes. A influência do Irã na região, que já é grande na Faixa de Gaza e no Líbano, por meio da organização Hezbollah, um dos mais intensos inimigos de Israel, pode se tornar maior ainda. É improvável que no curto ou médio prazo haja um rompimento entre EUA e Israel ou um reatamento entre EUA e Irã. Mas os acontecimentos recentes indicam um futuro nessas relações que pode ter desdobramentos imprevisíveis. 
Carlos Eduardo Lins da Silva é Global Fellow do Woodrow Wilson Center

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