Paulo Metri: O pré-sal e a política entreguista
COTIDIANO
Paulo Metri: O pré-sal e a política entreguista
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- Publicado em Sexta, 13 Setembro 2013 13:49
Contratos de concessão assinados entre o Estado e transnacionais trazem prejuízos para o Brasil
Do IHU On-Line
Apesar de a Petrobras deter 91% das reservas do petróleo brasileiro, os contratos de concessão assinados entre o Estado brasileiro e as petroleiras internacionais fizeram com que o País perdesse "1,54 bilhão de barris de petróleo” em 2012, “dos 15,72 bilhões de barris de petróleo”, informa o engenheiro Paulo Metri, em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail. Segundo ele, “as petrolíferas estrangeiras impuseram, como condição para virem para o Brasil, poder exportar o petróleo produzido. Os governos aceitaram e continuam aceitando esta condição. Assim, nenhuma refinaria é construída por elas no Brasil. A razão é óbvia, pois a maioria possui refinarias nos seus países de origem, que dependem do petróleo vindo do exterior”.
Metri explica que os contratos de concessão possibilitam que “100% do petróleo descoberto e produzido” fique com as concessionárias. Como resultado, acentua, “o País perde a possibilidade de utilizar, em acordos entre países como elemento de negociação, a garantia de fornecimento regular de petróleo no médio prazo”.
Na entrevista a seguir, Paulo Metri também critica o leilão de Libra, que está previsto para o dia 21 de outubro deste ano, o qual irá conceder áreas para a exploração de petróleo e gás natural na região do pré-sal, na Bacia de Santos. “Sobre este leilão, que corresponde à alienação de uma riqueza no valor de, no mínimo, US$ 1 trilhão, o povo não sabe de nada. Libra é um campo com as reservas razoavelmente medidas, então, não pode ser leiloado. Leilão é, na melhor das hipóteses, para blocos com perspectiva de existência de petróleo. Só no Iraque e no Brasil se leiloa petróleo conhecido existente no subsolo, sendo que, no Iraque, há tanques, caças e metralhadoras apontadas para os iraquianos. E aqui? O que tem apontado?”, questiona. Na avaliação dele, Libra “tinha que ser entregue à Petrobras, sem leilão, para esta assinar um contrato de partilha com a União, se comprometendo a remeter 80% do lucro líquido para o Fundo Social, o que nenhuma empresa privada fará”.
Paulo Metri é graduado em Engenharia Mecânica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e conselheiro do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro.
IHU On-Line - Qual a atual situação da exploração do pré-sal brasileiro?
Paulo Metri - Na área do pré-sal existem 13 blocos, nos quais foram descobertos petróleo e, no momento, estão sendo feitas avaliações para verificar se estas descobertas são comerciais. Os campos, que estão em desenvolvimento ou produção, são Lula, Sapinhoá, Baleia azul, Jubarte, Marlim leste, Caratinga, Barracuda, Voador, Marlim, Linguado, Pirambu, Pampo e Trilha. Alguns desses nomes são conhecidos campos do pós-sal, onde existe petróleo também abaixo da camada de sal. Espadarte, Marlim sul e Parque das Baleias são também campos do pós-sal, cujas descobertas no pré-sal estão sendo avaliadas. Hoje, o pré-sal já produz mais de 300.000 barris por dia.
Em recente artigo o senhor mencionou que o Brasil assinou contratos com petroleiras internacionais, que não permitem ao governo determinar para onde o petróleo brasileiro deve ir. Por que esses contratos foram assinados e quais petroleiras participaram?
Esses contratos foram assinados porque os governos FHC, Lula e Dilma quiseram assinar. A Lei 9.478 diz claramente que a totalidade do petróleo descoberto por uma concessionária pertence a ela. Tendo a posse do petróleo e não existindo determinação legal contrária, a concessionária pode levá-lo para onde quiser.
Tem uma única exceção. Nos contratos das diversas rodadas, os defensores da entrega do petróleo nacional sem quase nenhum usufruto para a sociedade brasileira, ou seja, os “entreguistas”, que infelizmente estão em cargos de direção de diversos órgãos do governo brasileiro, colocaram uma cláusula nos contratos de concessão para aparentar preocupação com o abastecimento nacional. Esta cláusula diz que: “Se, em caso de emergência nacional, declarada pelo Presidente da República, houver necessidade de limitar exportações de Petróleo ou Gás Natural, a ANP poderá, mediante notificação por escrito com antecedência de 30 (trinta) dias, determinar que o Concessionário atenda, com Petróleo e Gás Natural por ele produzidos e recebidos nos termos deste Contrato, às necessidades do mercado interno ou de composição dos estoques estratégicos do País”. Eu espero que esta situação descrita para que o governo possa intervir no atendimento do mercado nacional nunca seja atingida, pois ela mais parece o caos.
A verdade é que as petrolíferas estrangeiras impuseram, como condição para virem para o Brasil, poder exportar o petróleo produzido. Os governos aceitaram e continuam aceitando esta condição. Assim, nenhuma refinaria é construída por elas no Brasil. A razão é óbvia, pois a maioria possui refinarias nos seus países de origem, que dependem do petróleo vindo do exterior.
Quanto aos contratos de partilha da produção, a parte que cabe aos contratados também pode ser levada para onde eles quiserem. Sobre quais petroleiras participam, são todas que estão no Brasil, como Shell, BP, Exxon, Chevron, Total, etc.
Que percentual do petróleo brasileiro pertence à Petrobras?
Da publicação “Monitor IBP” de julho de 2013, sendo IBP o Instituto Brasileiro de Petróleo, pode-se obter que as reservas brasileiras em 2012 eram de 17,26 bilhões de barris de petróleo equivalente. Este valor engloba as reservas de petróleo e as de gás natural. Deste total, 15,72 bilhões de barris de petróleo equivalente pertencem à Petrobras, ou seja, 91% das reservas brasileiras são da Petrobras.
Pode ser dito, também, que, em 2012, as reservas brasileiras eram só de 15,72 bilhões de barris de petróleo equivalente e o Brasil tinha, como reserva perdida, na data, 1,54 bilhão de barris de petróleo equivalente, já pertencentes basicamente às empresas estrangeiras, graças à ação dos “entreguistas”, facilitada pela alienação do nosso povo.
O senhor aponta o contrato de concessão como a pior opção de contrato entre o Estado e as empresas exploradoras de petróleo. Quais são os efeitos sensíveis desse modelo de contrato para o país?
Através das concessões, 100% do petróleo descoberto e produzido ficam com a concessionária. O país perde a possibilidade de utilizar, em acordos entre países como elemento de negociação, a garantia de fornecimento regular de petróleo no médio prazo. Perde também a maior parte da lucratividade da atividade petrolífera, que é enorme. As empresas deixam os royalties no país, uma menor parte do citado lucro, correspondentes a 10% de uma “receita depurada” por norma da Agência Nacional do Petróleo — ANP.
Além disso, as empresas estrangeiras compram pouco no país, haja vista que nenhuma plataforma foi comprada por elas, desde que ocorreu a primeira rodada de leilões para assinatura de concessões (lei 9.478), em 1999. Como compram pouco no país, repercutem pouco na contratação de mão de obra no país.
Mas a ANP coloca nas concessões um compromisso de conteúdo local para as concessionárias?
É verdade. Entretanto, a ANP não mostra os descumprimentos da cláusula de conteúdo local por parte das concessionárias. Como a multa pelo descumprimento é baixa e não existem outras penalidades, há dúvida se elas estariam realmente comprando no Brasil, com exceção da Petrobras, sobre a qual temos total controle.
O que motivaria as concessionárias a descumprirem o compromisso assumido?
Primeiramente, esta hipótese precisa ser constatada. Caso seja, as possíveis motivações seriam o preço do item, o prazo de entrega, a qualidade da produção, tudo referente ao Brasil. Pode ser também que o fornecedor estrangeiro faça parte do mesmo conglomerado da empresa petrolífera. Enfim, a ANP deveria prestar contas destes descumprimentos.
O senhor menciona que cerca de 900 blocos já foram concedidos através deste modelo, e 28% da área do pré-sal já foi concedida. Como se deu a distribuição desses 28%? Quem detém essas concessões?
Obtive estes cerca de 900 blocos somando todos os blocos colocados em leilão e que receberam ofertas das empresas, do site da ANP. Entretanto, não significa que existam hoje cerca de 900 concessões, porque algumas delas são devolvidas e, às vezes, os respectivos blocos são até leiloados de novo.
Quanto ao dado de que “28% da área do pré-sal já foi concedida”, ele foi obtido de texto da Associação dos Engenheiros da Petrobras — AEPET, pois não é mostrado pela ANP. A obtenção deste valor é trabalhosa porque é preciso identificar no site da Agência, para cada bloco da área, em qual rodada ele foi leiloado e, depois, identificar sua área. Com o somatório destas áreas e a área total do pré-sal, os 28% são encontrados.
Quanto à pergunta sobre os detentores atuais destas concessões, esta informação não é mostrada no site da ANP e não há como obtê-la sem as informações da Agência. Isto porque as empresas vendem suas participações em consórcios para outras, desistem de blocos, “unitizam” blocos e estas informações só são comunicadas à ANP.
De tudo isto, pode-se dizer que a ANP não comunica tudo que seria interessante de ser comunicado. Finalizando, posso lhe dizer que a Petrobras é concessionária de muitos blocos do pré-sal, na maioria das vezes associada a outras empresas, formando consórcios.
Em que consistem os contratos de partilha ou serviços?
No contrato de partilha, uma parte do lucro resultante da atividade petrolífera é destinada à União, além dos royalties que continuam sendo pagos. No caso brasileiro, esta parcela vai para um Fundo Social. O petróleo produzido também é rateado entre a empresa contratada e a União. No contrato de serviços, as empresas petrolíferas são chamadas somente para prestarem serviços típicos da atividade petrolífera para a União ou algum órgão que a representa. Neste contrato, a totalidade do petróleo e do lucro fica com a União. Não é preciso dizer que as empresas privadas odeiam tanto estes contratos quanto o monopólio estatal.
Então, a comunicação de massas, no tema “petróleo”, não é perfeita?
A alienação do povo, com relação a este e outros temas, é devido à grande mídia comercial — jornais, revistas, rádios e TVs comerciais — ser dominada pelo capital. Como consequência, graças a esta alienação com relação ao petróleo, as petrolíferas estrangeiras e os “entreguistas” estão comprometendo nossa riqueza sem grande usufruto para a sociedade.
E como você avalia o futuro leilão de Libra?
Sobre este leilão, que corresponde à alienação de uma riqueza no valor de, no mínimo, US$ 1 trilhão, o povo não sabe de nada. Libra é um campo com as reservas razoavelmente medidas, então, não pode ser leiloado. Leilão é para, na melhor das hipóteses, blocos com perspectiva de existência de petróleo. Só no Iraque e no Brasil se leiloa petróleo conhecido existente no subsolo, sendo que, no Iraque, há tanques, caças e metralhadoras apontadas para os iraquianos. E aqui? O que tem apontado?
Libra tinha que ser entregue à Petrobras, sem leilão, para esta assinar um contrato de partilha com a União, se comprometendo a remeter 80% do lucro líquido para o Fundo Social, o que nenhuma empresa privada fará. Esta entrega direta à Petrobras é prevista no artigo 12 da lei 12.351. Esta é a única forma, hoje, já que não temos o monopólio, de não se permitir que Libra sirva somente para a acumulação capitalista, sem trazer grande usufruto para a sociedade.
Se for feita uma enquete nas ruas do Brasil, de norte a sul, perguntando ao povo: “O que você acha sobre o leilão de Libra, que irá acontecer em 21 de outubro próximo?”, será constatado que 99% da população desconhece o que é Libra. Um assunto tão relevante mereceria, no mínimo, um plebiscito bem organizado para a decisão ser tomada.
Enquanto isso, a questão dos royalties, que são uma parcela menor, é discutida à exaustão pela mesma estratégia vitoriosa de desviar a atenção. A população deveria ir para as manifestações com cartazes contra o leilão de Libra. Ou a presidente Dilma poderia, com uma simples penada, resolver tudo isto, cancelando este dano social.
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