A reconstrução política de Dilma A dez meses da campanha, com a popularidade em alta e programas bem-aceitos, a presidenta tenta iniciar uma nova relação com o Congresso e a sociedade

A reconstrução política de Dilma

A dez meses da campanha, com a popularidade em alta e programas bem-aceitos, a presidenta tenta iniciar uma nova relação com o Congresso e a sociedade

Paulo Moreira Leite


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REFAZENDO A PONTE
Na terça-feira 27, Dilma foi pela terceira vez ao Congresso
desde a posse. Tirou fotografias, conversou com parlamentares
e até cumprimentou integrantes do chamado baixo clero
Nem todo mundo no Planalto quer admitir, mas está em curso no governo a reconstrução política da presidenta Dilma Rousseff. Atingida em cheio pelos protestos de junho, quando sua aprovação foi abalada nas ruas, caindo 30 pontos, a presidenta exibe 90 dias depois a saúde de um paciente que saiu da UTI, recebeu alta dos médicos e voltou para casa. Ninguém acredita que um dia ela voltará a exibir os índices espetaculares de  março, quando o governo era aprovado por 63% dos brasileiros e a popularidade de Dilma chegou a 77% , recorde jamais igualado por qualquer antecessor, nem Luiz Inácio Lula da Silva. Mas, de acordo com o mais recente levantamento do DataFolha, Dilma saltou seis pontos nas  pesquisas de intenção de voto e chegou a 36% das preferências para 2014. No Ibope,  a presidenta está com 38% das intenções de voto. Pesquisas internas, encomendadas pelo próprio PT,  apontam para 41%.

Apurou-se outra novidade nesse levantamento interno. Entre aquela presidenta que enfrentou as maiores e mais agressivas mobilizações de rua depois da democratização do País e a chefe de Estado que na semana passada se encontrava às voltas com a crise no Itamaraty, consolidou-se uma personalidade política com luz própria, menos dependente de seu padrinho, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre petistas graduados, que tiveram acesso aos dados completos da pesquisa, acredita-se que Dilma recolhe, em 2013, os frutos de uma postura de prezar valores éticos que assumiu desde o início do governo, quando declarou sua rejeição aos “malfeitos” e promoveu “faxinas” para afastar auxiliares suspeitos. Motivo de tantas críticas entre aliados do governo, a lendária rejeição de Dilma pelas barganhas promíscuas do Congresso também ajudou a presidenta a identificar-se com manifestantes que protestaram para sublinhar seu inconformismo.
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ALAVANCA
O Programa “Mais Médicos” contribuiu para o
crescimento de Dilma nas pesquisas para 2014
Lembrando as críticas que Dilma recebeu depois que apareceu na tevê para defender medidas como a reforma política e o plebiscito, hoje apoiadas por mais de 80% da população, e o Mais Médicos, projeto que levantou polêmica em sua fase inicial, mas, aos poucos, conquistou  sustentação junto à maioria da população, o senador Delcídio Amaral (PT-MS), um dos principais interlocutores da presidenta, repara a ironia dessa situação. “A maioria dos políticos costuma dizer que é preciso ficar longe das crises para não se contaminar. Falam que não se deve trazer problemas para o colo. Todos fizeram isso, menos a presidenta, que foi atrás de soluções. Enquanto ela cresceu, os adversários sumiram.”

Nem tudo se resume a uma orientação política adequada. A presidenta, na verdade, arregaçou as mangas para ir atrás do eleitor naqueles lugares em que ele se mostrava mais arredio. No último mês, reservou três dias da semana para viagens para São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, onde as pesquisas demonstraram que os protestos causaram estrago maior. Num comportamento inspirado, segundo auxiliares, no espetáculo de simplicidade apresentado pelo papa Francisco na visita ao País, em duas oportunidades a presidenta afastou-se da equipe de seguranças para caminhar à solta entre a multidão das ruas. Fez isso em São Paulo, antes de visitar a sede de uma central sindical, e repetiu o comportamento em Belo Horizonte, na semana passada, quando percorreu locais que frequentava na juventude. Convencida de que não terá nada a ganhar caso venha a exibir um comportamento excessivamente tolerante no Congresso, mas terá muito a perder em demonstrações fúteis de hostilidade em relação a senadores e deputados, nas últimas semanas Dilma cumpriu uma agenda parlamentar mais recheada do que em seus dois anos e oito meses de mandato presidencial. Realizou três reuniões com lideranças da Câmara e três no Senado. Na semana passada, quando soube que uma comissão de parlamentares pretendia marcar uma audiência no Planalto para lhe entregar as conclusões da CPMI sobre a Violência Doméstica, Dilma inverteu os papéis. Decidiu que ela iria ao Congresso, em vez de o Congresso ir até ela. Foi a  terceira visita à Casa desde a posse, mas foi a mais cordial. Acolhedora, Dilma tirou fotografias, conversou com parlamentares no caminho “e até cumprimentou integrantes do baixo clero,” afirma um deles. É bem verdade que, um dia depois dos afagos, a cúpula do Congresso – leia-se a dupla Henrique Eduardo Alves, presidente da Câmara, e Renan Calheiros, do Senado – apresentou propostas desagradáveis ao Planalto, como a de ampliar a fiscalização de comissões da Casa sobre projetos do governo federal. Mas Dilma parece estar de olho bem aberto para eventuais traições. E, neste novo momento da interlocução com o Congresso, saberá a hora de pagar e cobrar suas faturas políticas.
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FAVORITISMO
A senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS) não vota em Dilma, mas
acredita que a presidenta “só perde a eleição para ela mesma
Uma das mais ativas adversárias do governo no Congresso, a senadora Ana Amélia (PP-RS) reconhece a recuperação de Dilma e admite que a presidenta atravessa um novo e importante momento. Para Ana, o cenário que se desenha ameaça recriar uma situação política que o País já viu outra vez. Como existem adversários envolvidos na luta interna, como o PSDB, e os que enfrentam problemas para viabilizar a candidatura no TSE, como Marina Silva, “no momento Dilma está sozinha no cenário, de novo. A oposição não aparece”, avalia a senadora. Mesmo fazendo questão de dizer “eu não  voto nela”, Ana Amélia lembra que “Dilma só perde para ela mesma.”

A presidenta  pode perder para a economia também. O governo enfrenta as intempéries de uma crise internacional que lança dúvidas e incertezas sobre as oportunidades oferecidas à maioria dos países de economia média para cima, como o Brasil. Mas Dilma tem direito a festejar os meses recentes, quando, para desmentir o alarmismo de tantos adversários, a inflação caiu para um patamar próximo de zero, o que também vitamina a aprovação de qualquer governo.  Com o auxílio de medidas cuidadosas, o desemprego se mantém no patamar mais baixo da história. Marcados para os próximos meses, os leilões do pré-sal, de ferrovias e estradas oferecem ao governo várias oportunidades reais para atrair investimentos de porte. Resta saber se o governo irá cumprir sua parte, oferecendo regras e condições para interessar os investidores em vez de criar normas burocratizadas e pouco convidativas que possam afugentá-los.

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