PAPAS,ALEMANHA,PODER,INTELECTO E DINHEIRO

RELIGIÃO - 01/03/2013 22h38 - Atualizado em 01/03/2013 22h50
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Os alemães que fazem papas

A união, o poder financeiro da Igreja da Alemanha e o peso intelectual de seus teólogos decidiram os dois últimos conclaves. A história se repetirá?

RODRIGO TURRER E IVAN MARTINS, COM JULIANO MACHADO
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TODO-PODEROSOS Bispos em procissão rumo  à Basílica dos Catorze Santos Auxiliares, em Bad Staffelstein, na Bavária, no ano passado. Os alemães podem definir o novo papa (Foto: Daniel Karmann/EPA)
No conclave que elegerá o sucessor de Bento XVI, já se sabe com alguma certeza que caberá aos seis cardeais alemães no encontro o papel decisivo. O país que deu ao mundo o teólogo bávaro Joseph Ratzinger, eleito pontífice em 2005, e que, antes disso, já fizera do polonês Karol Wojtyla o papa João Paulo II, prepara-se, agora, para colocar à frente do rebanho de 1,2 bilhão de católicos outro nome de sua preferência. Pode ser até um cardeal brasileiro de origem alemã, Dom Odilo Scherer. “A influência dos alemães é enorme e foi decisiva nos últimos dois conclaves”, disse a ÉPOCA Andrea Tornielli, historiador e vaticanista do jornal La Stampa. “Com o pontificado de Ratzinger, eles se fortaleceram ainda mais.”
>>Fotos: Castel Gandolfo, o refúgio de Bento XVI após renúncia

 Embora não se trate de um gigante do catolicismo – a Alemanha tem apenas a quinta maior população de católicos da Europa, atrás de França, Itália, Espanha e Polônia –, a influência alemã no interior da Igreja é enorme (leia o gráfico abaixo). Ela é assegurada pelo peso histórico de seus teólogos, que fizeram da Alemanha um dos centros mundiais do pensamento católico, prolonga-se pela unidade do episcopado alemão, que se apresenta unido e uniforme diante do clero de outros países, e chega ao apogeu no enorme poder econômico da Igreja germânica. A riqueza da Igreja alemã se reflete em obras de caridade e no apoio às comunidades católicas do mundo inteiro. “Não há nenhuma diocese brasileira que não tenha recebido dinheiro alemão”, afirma o teólogo Volney José Berkenbrock, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora. “Eles não usam isso como moeda de troca, longe disso, mas influência é influência.”
A força da igreja alemã (Foto: reprodução/Revista ÉPOCA)
Na tarde de quinta-feira, quando o alemão Bento XVI se despediu dos fiéis da sacada do Castel Gandolfo, dando início a uma existência inédita como papa emérito, abriu-se para a Igreja um período de dúvida e ansiedade. Naquela manhã, durante sua despedida dos cardeais, ele declarara sua “incondicional reverência e obediência” ao novo papa que emergiria do conclave. Tentava, com esse gesto dramático, dirimir a dúvida essencial criada por sua renúncia: com quem ficará o poder em Roma quando ainda vive, entre os muros do Vaticano, um homem que leva o título de Sua Santidade, usa a batina branca de pontífice e é chamado pelo nome papal de Bento XVI?
>>Bento XVI, o papa da tradição

No dia anterior, em sua última audiência pública, o papa já tentara tranquilizar o mundo católico, ao afirmar que pretende seguir o exemplo de São Bento de Núrcia, que inspirara seu nome como papa. É de São Bento, padroeiro da Europa, criador da Ordem dos Beneditinos, o lema latino ora et labora, que significa “reza e trabalha”. 
>>O futuro da Igreja no próximo papado

São Bento nasceu no século V, filho de nobres romanos. Na juventude, escolheu viver em isolamento e oração. Quando foi chamado por monges para viver entre eles, seus modos austeros provocaram antipatia, e tentaram envenená-lo duas vezes. Salvo pela intervenção divina, abandonou o convento e voltou ao isolamento. Os católicos acreditam que tenha realizado inúmeros milagres.
>>Um papa brasileiro?

Ao comparar-se a São Bento, o papa emérito sugeriu que, daqui por diante, deseja contribuir para a Igreja e para o mundo em isolamento e oração. Ao mesmo tempo, lembrou que, dentro da Igreja, fora vítima de incompreensão e rejeição, como São Bento. Pareceu sincero em seu desejo de deixar para trás o que fosse possível deixar. “Não retorno à vida privada”, disse na quarta-feira. “Não carrego mais o poder do governo da Igreja, mas, no serviço da oração, permaneço dentro dos limites impostos por São Pedro.”
a mensagem papa 771 (Foto: reprodução/Revista ÉPOCA)
Como cardeal Ratzinger, ele foi um símbolo da influência do clero alemão. Professor de teologia na Universidade de Bonn, fez parte de uma corrente milenar de intelectuais que moldaram o pensamento católico nos últimos séculos. O primeiro pensador teológico alemão foi Bruno von Köln, ou São Bruno de Colônia. Em 1084, ele fundou a Ordem dos Cartuxos, considerada a mais rígida de todas as ordens religiosas católicas.

Além de gozar enorme respeito intelectual – a Alemanha ainda é o destino da maior parte dos estudantes de teologia do mundo inteiro –, a Igreja alemã é coesa e unida. Mesmo em momentos de crise, não se ouvem vozes dissidentes tramando contra seus rivais – algo corriqueiro no Brasil ou na Cúria Romana. Há menos de dois anos, no ápice de uma série de casos de pedofilia envolvendo padres e bispos, o episcopado alemão decidiu ser transparente. Seus bispos criaram uma linha especial, por telefone e on-line, para denúncias de vítimas. Também abraçaram dois projetos científicos, em parceria com Institutos de Criminalística, para investigar e analisar casos de pedofilia de 1945 até o presente – uma abertura que observadores viram como exemplar.
>>Qual é o futuro da Igreja?

O fator preponderante que faz da Igreja alemã uma potência é seu poder econômico. Desde o fim do século XIX, quando houve a separação oficial entre Estado e religião no país, a lei prevê impostos em favor das igrejas católica e protestante. Na prática, é um dízimo. Quem se declara integrante de uma comunidade religiosa contribui com uma taxa de 8% a 9% sobre o total de seu Imposto de Renda. Com isso, a Igreja Católica da Alemanha arrecadou, em 2010, a quantia de € 5,3 bilhões. Uma considerável parte desse dinheiro é canalizada para o Vaticano.

Outra parte substancial vai para agências de caridade que atuam em países em desenvolvimento. A maior delas é a Missão Adveniat, criada em 1961, na cidade de Essen. Ela tem mais de 2 mil projetos na América Latina, onde gastou € 37,3 milhões em 2010. A segunda maior agência católica alemã é a Caritas. Fundada em Friburgo, em 1897, ela se tornou uma confederação de 162 organizações humanitárias católicas, atua em 200 países e arrecadou € 71,3 milhões na Alemanha. Há ainda a Misereor, que gastou mais de € 40,3 milhões em projetos na África em 2010, e a Missio, que investiu € 23,9 milhões em países da Oceania e da Ásia.

Essas obras fazem com que católicos do mundo inteiro estejam em contato com o clero alemão. É algo que não ocorre com italianos ou franceses. Isso assegura a proximidade das relações e leva as ideias da Igreja alemã a ser ouvidas com atenção em toda parte – sobretudo no recinto do conclave. Somadas, as regiões do mundo com maior atuação das agências alemãs reúnem 53 cardeais entre os 115 que elegerão o novo papa. “Por causa disso, os alemães influenciam o destino de um conclave”, afirma o vaticanista Tornielli. “Foi o que vimos na eleição de João Paulo II.”
DESPEDIDA Bento XVI faz seu último discurso para fiéis reunidos em frente ao Castel Gandolfo. Ele quer viver  de acordo com o  exemplo de São Bento (Foto: AFP)
Em 1978, a escolha do polonês Karol Wojtyla surpreendeu a maioria dos religiosos e vaticanistas. Depois da inesperada morte de João Paulo I, apenas um mês depois de sua eleição, parte dos cardeais achou que era hora de eleger um não italiano para o trono de São Pedro. Era preciso sair do marasmo da tradição de papas peninsulares, mas sem ceder ao exotismo de um papa de fora da Europa. Se viesse do Leste Europeu, melhor: uma região tiranizada pelo comunismo, que dava mostras de enfraquecimento. Os alemães queriam fazer pressão sobre a Polônia comunista para desestabilizar a Alemanha Oriental. Comandados pelo arcebispo de Munique, o então cardeal Ratzinger, e pelo arcebispo de Colônia, cardeal Josef Höffner, os cardeais alemães formaram o “partido alemão”: uma união de cardeais fechados em torno do arcebispo de Cracóvia, Karol Wojtyla. Ele foi ungido João Paulo II.

Em 2005, Ratzinger foi escolhido papa num conclave em que era o franco favorito. A influência alemã no Vaticano cristalizou-se em seus oito anos de papado. A Congregação para a Doutrina da Fé é comandada pelo arcebispo alemão Gerhard Ludwig Müller, teólogo respeitado e expoente do conservadorismo. O Instituto para Obras de Religião (IOR), mais conhecido como banco do Vaticano, é dirigido por Ernst von Freyberg, banqueiro alemão de origens aristocráticas e devoto fervoroso.

“Há uma forte aliança entre os cardeais alemães que participam do conclave. O papa os fortaleceu, mas eles sabem que não haverá um novo papa alemão agora”, afirma Andreas Englisch, o mais conhecido vaticanista alemão, autor da biografia de Bento XVI O homem que não queria ser papa (editora Universo dos Livros), recém-lançada no Brasil. Os favoritos dos alemães são o cardeal canadense Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos na Santa Sé; o arcebispo de Viena, Christoph Schönborn, e o brasileiro Dom Odilo Scherer. Entre esses, Englisch acredita na escolha do brasileiro. “Os cardeais da Alemanha têm grande admiração pelo trabalho de Scherer e o preferem a Schönborn. Se os outros cardeais perceberem que os alemães podem apoiar Scherer em bloco, pode-se criar um efeito em cadeia no conclave.” Nesse caso, o poder de influência dos alemães terá levado à escolha do primeiro papa brasileiro.

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