Joaquim, o supremo

Joaquim, o supremo

Presidente do STF, Joaquim Barbosa perde a compostura e revela descontrole verbal ao mandar jornalista "chafurdar no lixo". Esse comportamento cada vez mais recorrente não condiz com o posto que ocupa

Izabelle Torres e Josie Jeronimo
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No final do ano passado, quando as atividades do Judiciário brasileiro se encerraram, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, brilhava como um ídolo nacional. Ele tinha assumido o cargo dois meses antes e, graças à firmeza com que conduziu o processo do mensalão, passou a ser encarado como um combatente contra a corrupção e os desmandos da política. Voz forte e decisiva para mudar uma história de impunidades. Também não faltaram especulações sobre eventuais apetites eleitorais do ministro, até para a Presidência da República. Agora, sob constantes e previsíveis holofotes na volta das férias forenses, Joaquim Barbosa tem provocado rebuliços. Num curto espaço de tempo, ele fez declarações e tomou atitudes nada corriqueiras para a tradicional fleuma do judiciário. Disse que os magistrados brasileiros são tíbios e conservadores, foi ovacionado por plateias em eventos culturais, apareceu em colunas sociais com sua nova namorada, previu prazos para colocar mensaleiros na cadeia (com o que desagradou os colegas do STF) e ofendeu jornalistas que tentavam entrevistá-lo. Supremo mesmo, quem pareceu não foi a Corte, mas o ministro.
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Em Trancoso (BA), Joaquim Barbosa posou para foto ao lado da namorada
A solenidade e um certo distanciamento da vida mundana são mais que uma herança ritualística do Judiciário. Embora tragam o risco de simbolizar inacessibilidade, servem para marcar a capacidade de a Justiça não se deixar influenciar pelo que é alheio aos processos que julga. Nesse sentido, toda a movimentação de Barbosa pareceu fora de tom. Um outro Barbosa famoso, o Ruy, um dos maiores juristas da história do País, advertia que “o poder não é um tablado”. Ruy Barbosa também era um defensor radical da transparência pública, pois entendia que não podia haver “segredos” para a nação: “A autoridade não é uma capa, mas um farol”, dizia o Águia de Haia. Os diálogos ríspidos e as reações grosseiras de Joaquim Barbosa nas últimas semanas expressaram uma inadequação do ministro aos ambientes transparentes. O episódio da terça-feira 5, quando o repórter Felipe Recondo, de o Estado de S. Paulo, aproximou-se do ministro para uma rápida entrevista, foi revelador: 
– Como o senhor está vendo... – iniciou o repórter.
 – Não estou vendo nada. Me deixa em paz, rapaz. Me deixa em paz. Vai chafurdar no lixo como você faz sempre – respondeu Barbosa.
– Mas eu tenho que fazer pergunta. É meu trabalho, ministro. 
– Sim, mas eu não tenho nada a lhe dizer. Eu não quero nem saber do que o senhor está tratando – continuou Barbosa. E, já caminhando, chamou o repórter de “palhaço”.
Numa nota divulgada no mesmo dia, um assessor de imprensa apresentou um pedido de desculpas em nome do ministro. Alegou que Joaquim Barbosa se encontrava “tomado pelo cansaço e por fortes dores”. Também argumentou que se tratava de um “episódio isolado, que não condiz com o histórico de relacionamento do ministro com a imprensa”.
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O episódio, na verdade, não chega a ser isolado. Em novembro do ano passado, assim que Joaquim Barbosa fora eleito para comandar o STF, um repórter de televisão fez uma pergunta que estava na cabeça de muitas pessoas que acompanhavam o julgamento do mensalão. Queria saber se Barbosa “estava mais calmo” depois de chegar à Presidência. O ministro sugeriu que o repórter – por ser negro – não deveria fazer uma pergunta como aquela. “Vocês esperavam ver o Joaquim quebrando cadeiras? Logo você, brother. Pergunta de branco. A cor da minha pele é igual à sua. Eles (os outros jornalistas) foram educados e comandados para levar adiante esses estereótipos, mas você, meu amigo?”
Na quinta-feira 28, numa entrevista a correspondentes estrangeiros, Barbosa discorreu sobre o que seria um “problema orgânico dentro da própria instituição judiciária”. Segundo ele, os juízes brasileiros “têm medo de julgar”, possuem mentalidade “mais conservadora, pró-status quo, pró-impunidade.” Já os procuradores teriam uma mentalidade “rebelde”. As declarações do presidente do STF produziram uma reação indignada das associações de magistrados. Desde sua chegada à Corte, em 2003, Joaquim Barbosa acumulou um conjunto de refregas que acabaram em xingamentos, dirigidos a jornalistas ou não. Em contrapartida, vem mostrando encanto pela ribalta. Na semana passada, foi ovacionado e posou para fotos ao lado da jovem namorada numa pousada em Trancoso, na Bahia. Durante o julgamento do mensalão, o ministro Marco Aurélio de Mello já havia empregado palavras duras para criticar o comportamento de Joaquim Barbosa: “Não admito que Vossa Excelência suponha que todos são salafrários e só Vossa Excelência seja uma vestal”, disse. A mudança de atitude do presidente do STF pode parecer um grande desafio. Mas certamente não é impossível para um cidadão que construiu uma biografia, que hoje é motivo de orgulho para tantos brasileiros.
Montagem sobre foto de Nelson Jr.Sco/STF

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