O retrato da nova família Censo mostra como a ampliação da participação feminina no mercado de trabalho, a maior expectativa de vida e as facilidades para se divorciar mudam a cara da sociedade brasileira


O retrato da nova família

Censo mostra como a ampliação da participação feminina no mercado de trabalho, a maior expectativa de vida e as facilidades para se divorciar mudam a cara da sociedade brasileira

Tamara Menezes
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TENDÊNCIA 
Herriot e Rosana são um exemplo da nova organização familiar: estão no 
segundo casamento, não oficializaram a união e as filhas dela moram com eles
A gerente comercial Rosana Fonseca, 50 anos, e o analista de sistemas Herriot Carvalho Filho, 51 anos, se reen­contraram numa festa depois de três décadas, em 2008. Namorados na adolescência, seguiram caminhos diferentes, casaram com outras pessoas, tiveram dois filhos cada, e se separaram. Menos de um ano após o reencontro, já estavam dividindo a casa. A família veio pronta: as duas filhas de Rosana moram com eles e os dois de Herriot, que vivem com a mãe, se juntam ao grupo em fins de semana. Segundo o censo de 2010, divulgado na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Herriot e Rosana fazem parte de um contingente de 4,4 milhões de lares compostos por pessoas que se separaram anteriormente ou ficaram viúvas. Também estão entre os 36,4% dos casais que não oficializaram a união nem no civil nem no religioso. Assim, como as meninas integram o grupo de 2,5 milhões de enteados que vivem com padrastos ou madrastas. 

Os dados mostram como a sociedade brasileira está se organizando de forma muito parecida com a europeia e a americana. Basta ver como aumentou o número de pessoas que vivem sozinhas, os registros civis de casamentos homoafetivos, os divórcios, as mulheres chefes de família, além da queda intensa na fecundidade, fenômeno observado em todas as regiões brasileiras, independentemente de raça ou nível econômico (leia quadro). É o novo retrato do País.
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“Todo mundo se dá bem. As filhas da Rosana, mais novas, trocam experiência com os meus filhos, que já estão na faculdade”, atesta Herriot, que se considera pai de todos. Essa é a primeira vez que o IBGE aferiu a categoria “famílias reconstituídas”, que incluem enteados e novos arranjos. O filme “Os seus, os meus, os nossos” (1968) é citado por especialistas como referência – a trama retrata uma família americana com filhos de uniões anteriores. O que já acontecia nos Estados Unidos e na Europa nos anos 1970 virou tendência aqui e a nova realidade requer jogo de cintura de todos. “A convivência com enteados quase sempre é conflituosa porque reúne pessoas com costumes diferentes”, diz a psicóloga e especialista em psicopedagogia Andreia Calçada. “Mas com flexibilidade, todos podem conviver.”

O segundo (ou terceiro) casamento aumentou na medida em que cresceram o divórcio – quase duplicou em uma década – e, igualmente, a expectativa de vida. “Há nuances que só agora são capturadas. Os recasamentos e as uniões não oficializadas geram impactos que serão sentidos a curto e longo prazos”, afirma a socióloga Clara Araújo, pesquisadora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Segundo ela, alterações recentes na legislação, como divórcio simplificado e regulamentação da união estável, facilitaram a reconfiguração das famílias.
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As formas diferentes de organizar a casa e a família também estão ligadas à maior participação da mulher no mercado de trabalho. Mulheres no comando dos lares já são 32,2%, contra 22,2% dez anos antes. “Isso reflete uma novidade do ponto de vista cultural”, acredita Gilson de Matos, estatístico do IBGE. As despesas da casa agora são compartilhadas entre os moradores em 34,5% dos domicílios. E aumentam os casais sem filhos que agora chegam a 20,2% do total. “A taxa de fecundidade menor mostra que mais gente decidiu não ter ou postergar a gravidez para, primeiro, se firmar profissionalmente”, avalia Matos.
Fora do casal tradicional, as mulheres são maioria em vários critérios: na criação de filhos sem parceiro, na opção de morar só e no número de relacionamentos homoafetivos (53,8%). Confirmando a expectativa de vida maior para elas, há mais viúvas. As idosas com 65 anos ou mais são a parcela mais expressiva das residências onde vive apenas uma pessoa, que totalizam 6,9 milhões de lares. Essa forma de viver, que implica mais gastos e mais vulnerabilidade, alcança 12,1% dos imóveis pesquisados, em sintonia com o que acontece em países desenvolvidos. Na Europa, a média é de 27,7% das residências ocupadas por apenas uma pessoa. Mais uma faceta da nova sociedade brasileira. 
Foto: Masao Goto Filho/ag. Isto É
Fonte: IBGE

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