Mensaleiros votaram para endurecer penas por corrupção
Mensaleiros votaram para endurecer penas por corrupção
Entre 2003 e 2004, quando houve o pagamento de congressistas envolvidos no esquema, o Congresso aumentou a pena contra corruptos e corruptores
Laryssa Borges
Em julho de 2003, os então deputados Pedro Corrêa (PP-PE), Roberto Jefferson (PTB-RJ), Valdemar Costa Neto (PL-SP), José Borba (PMDB-PR), Romeu Queiroz (PTB-MG) e Bispo Rodrigues (PL-RJ) jamais imaginariam que, em uma espécie de reviravolta do destino, aprovariam uma lei que, nove anos depois, poderia ser responsável por levá-los para a cadeia, e com penas mais severas, pelo crime de corrupção passiva. Já condenados como corruptos, eles votaram a favor da mudança no rigor da lei, em sessão presidida pelo petista João Paulo Cunha, também condenado pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro.
Naquela tarde de 2003, esses sete personagens, todos já julgados por participarem do mensalão, autorizaram, em votação simbólica, uma reforma no Código Penal e o consequente aumento das penas para os crimes de corrupção ativa e passiva. Na ocasião, deram aval para a ampliação de um para dois anos de pena mínima e de oito para 12 anos de reclusão na sanção máxima para corrupção passiva. Daquela mesma sessão plenária participaram também os mensaleiros Professor Luisinho (PT-SP), João Magno (PT-MG), Paulo Rocha (PT-PA) e José Janene (PP-PR), este último morto em 2010.
Naquela época, durante o processo legislativo, ainda não era notório, mas deputados já negociavam e recebiam recursos criminosos do valerioduto, situação que, de dois meses para cá, foi confirmada pela suprema corte como propina para que desvirtuassem o mandato parlamentar. A mudança de legislação em meio ao pagamento de mensalão aos congressistas – a sanção pelo então presidente Lula foi em novembro de 2003 – pode levar agora os mensaleiros a penas maiores do que as previstas pela lei vigente no dia que receberam propina do valerioduto. Como uma ironia do destino, os mesmos mensaleiros que aprovaram em plenário penas mais duras para corrupção serão agora obrigados a provar do próprio veneno.
Isso porque uma súmula do STF prevê que, no caso de crimes continuados, como o de corrupção passiva (o recebimento de propina foi reiterado e ocorreu em circunstâncias similares e pelos mesmos autores), será aplicada na condenação a lei mais grave existente durante o cometimento de pelo menos um dos ilícitos. No caso do mensalão, mesmo se um parlamentar recebeu propina na vigência de uma lei mais leve, deve ser condenado a penas mais severas se depois recebeu nova parcela quando a legislação mais rígida estava em vigor.
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Em termos jurídicos, a súmula 711 do STF estabelece que “a lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. “Em crime continuado, se aplica a lei com pena mais rígida. Há jurisprudência em todo o Brasil sobre isso”, diz o criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que atua no julgamento do mensalão.
Pela lógica construída a partir da própria jurisprudência do Supremo, não importa se deputados do PP receberam 700 000 reais na vigência da lei mais leve sobre corrupção passiva. Os mesmos mensaleiros embolsaram, apenas por meio da corretora Bônus Banval, outros 905 000 reais quando a legislação mais rígida estava em vigor. Por isso, quando os ministros do STF forem definir as penas para Pedro Corrêa e Pedro Henry, por exemplo, devem fixar a pena-base relativa à lei mais dura sobre corrupção passiva e depois aplicar agravantes, se for o caso. Nas situações de crime continuado, em vez de responsabilizar o réu por todos os crimes com a soma das penas, impõe-se a pena mais grave, seguida de um aumento.
O mesmo vale para os réus do extinto PL, atual PR. Valdemar Costa Neto e seus auxiliares receberam 4,5 milhões de reais na vigência da antiga lei, que estabelecia penas amenas para corrupção, mas também garantiram o pagamento de 650 000 reais em propina sob a vigência da legislação mais dura.
Se os parlamentares corruptores deverão ser apenados com sanções mais rígidas, o mesmo deve ser aplicado, se condenados, àqueles que, segundo o Ministério Público, coordenaram o esquema do mensalão: José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. Conforme a denúncia da procuradoria-geral da República, a tríade petista, que continuará a ser julgada na próxima semana pelo Supremo, começou a determinar a distribuição de propina em meados de 2003 – período de vigência da lei mais leve – mas deu seguimento ao esquema criminoso também em 2004, quando as penas mais altas para corrupção estavam valendo. Com a súmula redigida pelo STF, os três dificilmente conseguirão se livrar de um maior número de anos de condenação.
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