Um sonho incompleto para os negros americanos 50 anos depois

Um sonho incompleto para os negros americanos 50 anos depois

  • De volta a palco de discurso de Luther King, negros ainda sofrem efeitos de discriminação, apesar de avanços
Gwen Harris. De volta com a família após cinco décadas: mesmas demandas Foto: Agência O Globo
Gwen Harris. De volta com a família após cinco décadas: mesmas demandas Agência O Globo
WASHINGTON — Meio século após a Marcha a Washington, evento decisivo da luta contra a discriminação racial nos Estados Unidos, a comunidade negra americana ainda vive à espera de ver realizado o sonho de uma sociedade justa e igualitária delineado das escadarias do Lincoln Memorial pelo reverendo Martin Luther King Jr, em 28 de agosto de 1963. A absolvição do assassino branco do menino negro Trayvon Martin, caso no qual o componente racial foi apontado como gatilho do desfecho trágico, e a decisão da Suprema Corte de derrubar artigo fundamental da Lei de Direito ao Voto, uma conquista histórica - ambas neste ano simbólico -, deixaram um rastro de indignação, a sensação de retrocesso e a certeza de que direitos civis são um assunto inacabado nos EUA. Amargando ainda indicadores socioeconômicos piores do que a média dos compatriotas, a população afro-americana dá sinais de fadiga com a trégua das últimas décadas, especialmente desde a eleição de Barack Obama - que discursará nesta quarta-feira nas mesmas escadarias.
ASSISTA AO DISCURSO DE MARTIN LUTHER KING.
Foi com a indignação estampada no peito - “Esta é uma questão importante”, dizia sua camiseta - que Gwen Harris, aos 74 anos, decidiu mais uma vez deixar o Alabama rumo à capital americana para marchar por seus direitos. Então uma jovem administradora de empresas, em 1963 ela tomou um dos ônibus que saíram da conflagrada Birmigham, palco das violentas repressões policiais a manifestantes que acordaram o Norte dos EUA para a brutalidade da segregação, para se juntar a 200 mil americanos naquele dia inesquecível. No último sábado, Gwen estava no mesmo lugar, acompanhada da filha Dru, 39 anos, e do neto Maxwell, de 5. Emocionadíssima, dividia-se entre a alegria de ver passados os tempos de perseguição e o pesar de ainda ter quase todas as mesmas demandas, resumidas em um lema: oportunidades iguais.
- Não estamos aqui só para celebrar, estamos aqui para um novo começo. Precisamos trazer os assuntos e a ação de 1963 de volta porque as pessoas ainda estão lutando para ter as mesmas oportunidades. Assim como eu, com mestrado, não alcancei o mesmo que meus pares brancos, e vejo as dificuldades da minha filha, que é enfermeira desempregada, temo que a história se perpetue com o meu neto. É hora realmente de um basta - disse Gwen, cujo pavor é que Maxwell seja um dia alvo, como Trayvon, de perseguição só por ser negro.
De mãos dadas com a filha, em regozijo típico das missas de domingo, Gwen ouviu as palavras do deputado John Lewis, 73 anos, único dos seis grandes líderes negros a discursar 50 anos atrás ainda vivo. E, com a multidão, reagiu com gritos e aplausos ao chamado por mobilização imediata.
- Muito ficou para trás 50 anos depois, mas ainda temos brigas. Há pessoas que querem nosso retrocesso. Mas não andaremos para trás. Se passaram 50 anos e não podemos mais esperar, não podemos mais ser pacientes. Não podemos assistir sentados à Suprema Corte tentar roubar nossos direitos. Queremos nossa liberdade e a queremos agora. Façamos barulho! - bradou Lewis.
Racismo mais sutil
Os avanços da comunidade negra são evidentes. A segregação acabou, os direitos de cidadania foram equiparados, houve mobilidade social e o poder político foi ampliado. A Câmara que passou as leis de Direitos Civis e Direito ao Voto nos anos 1960 tinha seis parlamentares negros. Hoje são 43, há dez vezes mais políticos negros eleitos para todos os cargos e a Casa Branca é ocupada por um afro-americano. Mas permanecem desequilíbrios fundamentais.
Apenas 85% dos negros têm o segundo grau completo, a taxa de desemprego de 12,6% entre os negros é muito superior aos 7,4% gerais, a renda familiar das famílias negras é dois terços da média nacional, apenas 43% delas têm casa própria e 28% dos afro-americanos vivem abaixo da linha de pobreza (quase o dobro da média da população). Os negros têm também os piores empregos e ocupam menos o topo da pirâmide do mundo corporativo.
- O racismo é mais sutil, mas os obstáculos permanecem. Cheguei à universidade egressa de uma comunidade pobre na Geórgia, onde todas as dificuldades são evidentes. Nos faltam subsídios para acessar educação de qualidade, nos faltam os equipamentos e estímulos quando jovens, nos falta emprego. E nos falta o Estado, desde iluminação pública até segurança, as autoridades não vão às comunidades como vão aos bairros brancos. Isso não pode mais se perpetuar - afirmou Tiffany Hallback, de 22 anos, aluna da Savannah State e militante do Conselho Nacional das Mulheres Negras.
A violência é outro reflexo da permanência da desigualdade. Um em cada 15 homens negros americanos está encarcerado nos EUA, com sentenças 10% mais longas. Afro-americanos têm três vezes mais chances de passar por revistas ao dirigir um veículo do que brancos. Mulheres negras encarceradas já são 200 mil e têm três vezes mais chances de parar na cadeia do que as brancas.
Para o reverendo Herbert Daughtry, ativista no Brooklyn, Nova York, os números escancaram o uso da raça como seletor da ação policial.
- Raça ainda é uma questão na nossa sociedade, e séria. Existe um encarceramento em massa em vez de uma ação para matrícula em massa de negros em universidades. E não é só. A falta de trabalho e de moradia decentes persegue a comunidade e revela descaso histórico. Há progresso, mas ainda são poucos aqueles que o experimentaram plenamente. Ter um presidente negro é simbólico, mas as políticas públicas têm que acompanhar. Do contrário, permanece a sociedade hipócrita e desigual.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/mundo/um-sonho-incompleto-para-os-negros-americanos-50-anos-depois-9722452#ixzz2dInE8vZO
© 1996 - 2013. Todos direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A. Este material não pode ser publicado, transmitido por broadcast, reescrito ou redistribuído sem autorização.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

VAZARAM AS FOTOS DE PAOLA OLIVEIRA NUA-Paolla oliveira nua pelada

Cheon Il Guk Matching Engagement Ceremony- O REINO DOS CÉUS NA TERRA E NO CÉU

Lista Negra: Veja o resumo de todos os episódios da primeira temporada